Há
onze anos, em pleno êxtase nacional com a sua seleção de futebol, onze gregos
comandados por um alemão, em pleno estádio da Luz explicaram aos portugueses o
que era uma tragédia grega. Portugal perdia o Campeonato da Europa para os
gregos, que venciam pela primeira vez tal competição. Meia dúzia de semanas
depois a Grécia recebia os Jogos Olímpicos, numa organização lindíssima, cheia
de simbolismo e com custos económicos altíssimos.
Os
gregos viviam o êxtase dos deuses e tudo era belo e bom, como a magia das suas
ilhas. Poucos imaginavam que a década seguinte lhes traria a mais brutal
tragédia social e económica que um país desenvolvido conheceu nos últimos
setenta anos. Sófocles jamais conseguiria escrever uma tragédia como a
realidade vivida pelos gregos nos últimos dez anos.
Rapidamente
descobriram quanta corrupção jorrava dos gabinetes dos seus governantes e
ficaram assustados com as dívidas que o país contraíra a juros altíssimos e
absolutamente impagáveis.
Reclamaram,
trocaram de governantes, fizeram greves e manifestações, puseram a ferros
alguns impostures, lançaram mão de todo o seu estatuto civilizacional,
aceitaram reduções de salários, afundaram a economia, mas a única coisa que
conseguiram foi umas esmolas internacionais para uma sobrevivência a prazo, por
entre humilhações nunca vistas.
Pediram
compreensão, tolerância, mendigaram ajuda, mas agora o Édipo da Europa é
tratado como um velho cego e errante, que cometeu o crime sem perdão de se
sentar à mesa dos deuses do dinheiro sem ter dinheiro para jogar o futuro da
sua gente nesta economia de casino em que a Europa se tornou.
Aturdidos,
desesperados, trocaram de rei à espera que o destino lhes lançasse um olhar de
comiseração. Talvez ainda não tenham percebido que o destino dos tempos
modernos é feito por gente sem coração nem memória, autênticos chacais à espera
da próxima vítima.
Amanhã
empunharão novamente o escudo da democracia contra a ignóbil bazuca do
dinheiro. Metade do povo do grego acha que a sua dignidade descende do escudo
de Aquiles, a outra tem imensas dores de calcanhar.
Gabriel
Vilas Boas
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