“Acácio Lino deverá ser visto, ainda, como
Pintor de História, na exigência das reconstituições, no fundo poético e
simbólico de algumas das suas obras como O Grande Desvairo, tangente às
formulações saudosistas do seu conterrâneo Teixeira de Pascoaes.”
António
Cardoso, 1996
Acácio Lino, O Grande Desvairo, óleo s/tela, Museu
Municipal Amadeo de Souza-Cardoso
(Fotografia de António Pinto)
(Fotografia de António Pinto)
Acácio
Lino continua hoje a ocupar-me o espírito; artista multifacetado, pintor e
escultor, deixou obra admirável que se pode apreciar bem aqui, na cidade de
Amarante…basta para isso entrar no museu Amadeo de Souza-Cardoso e calmamente
subir à galeria superior, atravessar a Sala António Carneiro e finalmente, entrar
na Sala Acácio Lino. Curioso como os três artistas amarantinos, da mesma época,
viram e pintaram o mundo de modo tão diferente e especial. Em cada uma das
salas, respira-se diferente, revivem-se épocas distantes, sente-se o exalar de
perfumes subtis de cada uma das telas que nos olham sem cessar. Esses perfumes
envolvem-nos, ora florais, ora dramáticos e sentimentais, ora irreverentes e
carregados de modernidade.
De Lino, disse-vos já que
aprecio sobretudo a sua pintura naturalista. De cores pastel, suaves e em retrato fiel de rostos e olhares , a que não é possível ficar indiferente, perpassam por nós paisagens e
cenas bucólicas, populares. Mas, como tão bem disse António Cardoso, “Acácio
Lino deverá ser visto, ainda, como Pintor de História, na exigência das
reconstituições, no fundo poético e simbólico de algumas das suas obras como O
Grande Desvairo, tangente às formulações saudosistas do seu conterrâneo
Teixeira de Pascoaes.”
A Pintura de História é
muito forte em Acácio Lino. E a obra “Grande Desvario” é avassaladora. Imbuído
de um certo neo-romantismo, a sua obra aborda também e preferencialmente a
temática histórica, sobretudo os episódios da época medieval, tão à moda
nacionalista, propondo novas e exaltadas leituras do acontecimento retratado,
sempre valorizando o herói idealista e entregue a uma causa. Aqui, a paleta
cromática é variada, com efeitos de claro-escuro que trazem dramatismo à cena,
acentuando-lhe sentimento.
A tela ”O Grande Desvairo”
leva-nos até Alcobaça, para onde D. Pedro translada Inês, aquela que “despois de ser morta foi Rainha”. Os seus túmulos, obras-primas da escultura gótica portuguesa merecem visita. Fernão Lopes deixou o seguinte registo sobre este momento singular da História de Portugal:
[...] mandou fazer huum muimento dalva pedra,
todo
mui
sotillmente
obrado, poemdo emlevada sobre a campãa de çima a imagem della com coroa na cabeça,
como se fora Rainha; e este muimento mandou poer no moesteiro Dalcobaça, nom aa emtrada hu jazem os Reis, mas demtro
na egreja ha maão dereita,
açerca da capella moor. E
fez
trazer o seu corpo do mosteiro de Samta Clara de Coimbra, hu jazia, ho mais homrradamente
que se fazer pode, ca ella viinha
em huumas andas,
muito bem corregidas pera tal tempo, as quaaes tragiam gramdes cavalleiros,
acompanhadas
de gramdes fidalgos, e muita outra gente,
e donas, e domzellas, e muita creelezia. Pelo caminho estavom muitos homeens com çirios nas maãos, de tal guisa hordenados,
que sempre o seu corpo foi per todo o caminho
per antre çirios
açesos; e
assi chegarom
ataa o
dito moesteiro,
que
eram dalli
dezassete legoas, omde com muitas missas e gram solenidade foi posto em aquel muimento: e foi esta a mais homrrada
trelladaçom,
que ataa aquel tempo em Portugal fora vista.
Aqui o herói é com toda a certeza, D. Pedro . Um círio ilumina a cena principal, destacando com grande luminosidade e dramatismo a deposição dos restos mortais de Inês. Uma névoa translúcida de incenso torna ainda mais místico o cenário. À volta do túmulo, o clero e bem próximos de Inês, os filhos. Flores brancas junto ao túmulo calcário, de uma beleza sem par.
Inês era muito bela – “os loiros cabelos a cair pelos ombros, os olhos verdes e brilhantes ,o porte sereno e suave como o de uma garça a andar pelos jardins do paço, a pele branca como a da mais branca pérola, os lábios graciosos, a beleza com qualquer coisa de divino”. Este amor português foi em tudo um grande desvairo. O desvairo final retratou-o aqui Acácio Lino. Até ao fim do mundo.
“Este inferno de amar”
“Este inferno de amar – como eu amo!
Quem mo pôs aqui n’alma... quem foi?
Esta chama que alenta e consome,
Que é a vida – e que a vida destrói
– Como é que se veio a atear,
Quando - ai quando se há- de ela apagar?
(…)”
Almeida Garrett, Folhas Caídas
Rosa Maria Alves da Fonseca
Belíssima, a (2ª parte) DA ARTE, DA PINTURA DE ACÁCIO LINO!!! Gostei muito da maravilhosa Tela de Acácio Lino. Amei, os versos de "Este Inferno de Amar"... de Almeida Garrett! Parabéns.
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