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sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

ARQUITETURA DE INCLUSÃO

PROJETANDO O FUTURO COM TODOS

A arquitetura é uma arte muito exigente. Necessita de espaço, precisa de recursos avultados, não dispensa o génio. Normalmente tem de lutar ainda com a incompreensão generalizada porque costuma afirmar--se pela rutura com aquilo que existe. É fácil encontrar gente com opinião, difícil é descobrir quem o faça de modo sustentado e dominando as várias perspetivas desta arte.
Eu gosto de olhar para a ideia arquitetónica duma cidade e talvez por isso admire a obra de Oscar Niemeyer, sobretudo o seu trabalho em Brasília. Mas o meu maior fascínio é a maneira como os arquitetos trabalham a relação dos espaços e dos edifícios com as pessoas. Com todas as pessoas. Tenho um particular apreço por aqueles que fazem propostas que têm em conta os cegos, os tetraplégicos ou as pessoas portadoras dum qualquer outro tipo de deficiência física-motora.
Alguns arquitetos já trabalham esses domínios em alguns edifícios públicos. No entanto, parece-me ainda claramente insuficiente. Desde logo porque são poucos os edifícios públicos que procuram promover uma arquitetura de inclusão, mas também porque não há o cuidado de alargar esse conceito às ruas em volta e grande parte do efeito pretendido perde-se. O que adianta um edifício estar preparado para receber uma pessoa de cadeira de rodas se o acesso se faz apenas por escadas? O investimento feito torna-se improdutivo e facilmente criticável. Os arquitetos devem educar os seus “clientes” para a necessidade de promover uma arquitetura inclusiva coerente. Por impositivo legal os edifícios públicos que agora se constroem de raiz já não negligenciam esta valência. E desejável seria que o mesmo se aplicasse às obras de recuperação de edifícios públicos ou privados com uma utilização coletiva.


Acho que podemos e devemos ir um pouco mais longe do ponto em que nos encontramos. O conceito de arquitetura inclusiva deve estar presente na construção particular e pública. As casas que os arquitetos hoje projetam devem considerar a possibilidade de serem habitadas ou frequentadas por pessoas com alguma limitação física ou motora. Há dezenas de pormenores no desenho interior e exterior duma casa que não consideram a existência deste tipo de pessoas. E elas existem. Quase todas as famílias têm um tio, um irmão, um amigo que não vai lá casa porque o acesso só se faz por escadas ou porque uma cadeira de rodas tem dificuldade em circular pelos vários espaços da casa, impreparados para elas.
Se pensarmos que as nossas capacidades físicas se vão degradando ao longo dos anos, percebemos rapidamente que a arquitetura de inclusão dará uma ótima ajuda a quase todos quando a velhice chegar.  
Com o aumento da esperança de vida, a arquitetura do século XXI tem um grande desafio pela frente: prolongar o bem-estar das pessoas nas suas casas o maior número de anos possível e contribuir de forma efetiva para uma sociedade integradora, onde a partilha dos espaços, dos objetos, dos edifícios e dos afetos seja possível para todos.
Gabriel Vilas Boas

7 comentários:

  1. Gabriel, o teu texto é muito atual e oportuno. Bem hajas.

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  2. Sem dúvida que estás cheio de razão. Esquecemos, frequentemente, que até hoje podemos ser nós... cada um de nós...

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  3. Parabéns pela mensagem aqui passada. Os nossos Arquitetos estão muito longe de considerar a inclusão como uma mais valia para os seus projetos. Lamento que assim seja mas é a verdade nua e crua. A grande maioria nem se digna a cumprir as leis. As Pessoas com Mobilidade Reduzida continuam a ser excluídas. Em 2013 comecei a tratar a temática da acessibilidade através de um Blogue - Minuto Acessível - e acredito que a contribuição de todos pode ajudar a mudar mentalidades. No entanto, começo a perceber que o caminho a percorrer vai ter que passar necessariamente pelos tribunais. Há leis que não se cumprem, as entidades fiscalizadores não atuam pelo que esse rumo será inevitável com o senão de sermos cúmplices do estado das 'coisas'. Vou seguir o blogue. Um abraço

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    1. Fernando Cardoso, embora concorda que ainda há muito a fazer nesta área, já consigo encontrar arquitetos com atenção às necessidades das pessoas com mobilidade reduzida. São poucos, mas em breve serão mais. É necessário que se crie uma cultura de inclusão. Quer o seu blogue quer este texto são um pequeno contributo. Obrigado pelo participação.

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  4. Com o aumento da esperança de vida, deviamos refletir na arquitetura... mas a começar pelos nossos Arquitetos!!! PARABÉNS GABRIEL!!!

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  5. Plenamente de acordo. É necessário todos refletirem sobre qual a arquitetura mais prática para todas as pessoas, sem com isso descurar o lado estético.

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  6. este é um assunto perigoso, pois quem tiver uma opinião um pouco diferente é crucificado. Sou arquiteto e tenho 3 membros da minha família com deficiência motora e acho que as leis em vigor são demasiadamente pesadas para a realidade. Nos edifícios públicos estou de acordo em que seja aplicada a lei das acessibilidades, embora isso não acontece e não é culpa dos arquitetos, eu já fiz espaços públicos, apliquei a lei das acessibilidades, mas a entidade depois não construiu, eles dizem que não tem de cumprir a lei pois os projectos são camarários e não precisam de aprovação. Mas a nivel particular acho ridículo, tenho cliente que não querem colocar rampas em casa, ou elevadores, etc e acho que estão no seu direito, apenas acho que se deveria de deixar espaço suficiente para que no futuro seja possível a transformação, mas na realidade a lei exige que fique já transformado, lei ridícula.

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