Ainda que com algum atraso... a segunda parte do artigo “História do Urbanismo” (a 1.ª foi a
11 de Abril). Tal como tinha dito, a temática da evolução das Cidades, será
concluída esta semana. Julgo que esta última fase é sem dúvida a mais
interessante do ponto de vista do urbanismo actual e a que gera igualmente mais
confusão e controvérsia.
Como vimos anteriormente
a diferentes períodos históricos correspondem diferentes formas de fazer a
cidade. Continuando numa linha cronológica iremos analisar a evolução das
cidades no período compreendido entre o séc. XVIII e os nossos dias.
A CIDADE DAS REVOLUÇÕES
A segunda
metade do séc. XVIII e primeira do séc. XIX foi um período de mudanças e de
revoluções, de mentalidades, inovações e de invenções na agricultura, nas
comunicações, etc. O início da Revolução Industrial, na
Inglaterra, coincide com a Revolução Francesa. O neoclássico, movimento cultural
europeu do século XVIII e parte do século XIX, defendia a recuperação da arte
antiga, especialmente a greco-romana, tida como modelo de equilíbrio, clareza e
proporção. No urbanismo, este movimento caracterizava-se pela racionalização dos
espaços urbanos, ordenação e regularização das fachadas, e a geometrização da
malha urbana.
Ilustração da cidade Neoclássica
Planta urbanística de Förster para Viena (1859) Vista
aérea de Bath (Inglaterra 1727-80), reformulação urbanística dosWood’s (pai e
filho).
Na Europa,
surgem os planos urbanísticos, dos quais podemos destacar o de Paris, onde o
barão Haussmann (1809-1891) reordena a cidade existente e o de Barcelona, onde
Cerdá (1815-1875) elabora um plano de expansão da nova cidade. Estes tornam-se
modelos de organização do espaço, copiados noutras cidades europeias.
O plano de
Haussmann para Paris ocorre na cidade existente e tem três objectivos
principais: uma melhoria do sistema de circulação, a resolução de problemas
sanitários e a unificação dos principais pontos da cidade através de um sistema
de eixos, as novas avenidas, rematadas por edifícios emblemáticos.
Imagem da Esquerda: Planta explicativa
do plano de Haussmann para Paris ; Imagem da Direita: Vista aérea de Paris
evidenciando o plano de Haussmanjá realizado.
O Plano de
Cerdá para Barcelona adota um papel precursor de urbanismo, ao traçar um plano
que procura resolver juntamente com os problemas espaciais os sócio-económicos
e administrativos. Datada de 1859, a reforma e ampliação de Barcelona, expõe um
desenho de malha ortogonal cortada por um sistema de vias diagonais que
interligam a cidade-velha com o novo traçado, unindo os principais pontos da
cidade. A área edificada é de 50% complementada com espaços verdes.
Plantas de Cerdá para Barcelona
Vista aérea da cidade de Barcelona
demonstrando plano de Cerdá, já executado.
A Revolução
industrial trouxe o desenvolvimento e a concentração de um novo sistema
económico transformando completamente a vida e a sociedade. Na cidade
industrial ergueram-se os bairros operários, construídos para albergar a vasta
mão-de-obra, mas onde as condições de vida eram realmente mínimas, praticamente
sub-humanas. Esta cidade operária, caracterizada pelo congestionamento e pela
insalubridade, não possuía sistema de abastecimento de água, nem esgotos, nem
recolha de lixo. Surgiu então a necessidade de uma ação pública, ordenando e
propondo soluções, aparecendo nessa altura o urbanismo higienista, com a
preocupação básica de melhorar as condições de salubridade nas cidades.
No século
XIX, voltou a utilizar-se o traçado em quadrícula, agora só por motivos de
economia utilitária e lógica capitalista, de especulação de terrenos.
Imagem da Esquerda: Esboço da colónia socialista em New Harmony (EUA) elaborada por Owen ; Imagem da Direita: Projeto da primeira Cidade-Jardim efectivamente construída – Letchworth (1904)
Esquema da proposta de Howard para a Cidade-Jardim (1898).
O urbanismo
enquanto disciplina despontou no final do séc. XIX, sendo uma área
multidisciplinar, em que a análise da forma urbana para além do contributo da
arquitetura, precisa também do contributo de outras disciplinas tais como a história, a
sociologia, a geografia e a ecologia.
A CIDADE DO PRESENTE
Nas
primeiras décadas do séc. XX, com todas as mudanças que as revoluções dos
séculos anteriores causaram no desenvolvimento das urbes, tornadas
“mega-cidades” e, por sua vez, com o despovoamento do campo, surgiram novos planos e
ideias de “construir Cidade”. São maioritariamente os arquitetos que dão uma
nova faceta ao urbanismo. Entre eles podemos destacar o funcionalista orgânico
Frank Lloyd Wright (1867-1959), o futurista Sant’Elia (1888-1916), os
racionalistas Walter Gropius (1883-1969) e Le Corbusier (1887-1965).
Imagem da Esquerda: Desenho da cidade BroadacreCity (EUA) idealizada por Wright; Imagem da Direita: Estudo para "A cidade futurista" (projeto para aeroporto e estação ferroviária em Milão), de Sant’Elia, 1914
Plano de Gropius para SiedlungTörten, Dessau. 1926-28
Para além do cuidado com o aspeto estético, os projetos destes urbanistas tinham em comum a preocupação com a distribuição das diferentes funções pela cidade, o traçado urbano, a distribuição de densidades e a localização e o desenho das áreas verdes. A maior parte destes projetos eram idealistas, visto proporem modelos ideais da cidade, afastados dos problemas reais destas e não propondo intervir para solucioná-los. Propunham assim um “projeto final” para uma cidade modelo, que teria requisitos para uma sociedade mais feliz.
Ville Radieuse foi
um projecto da cidade ideal de Le Corbusier, não concretizado
Plano para a cidade de St-Dié, dividida por funções zonificada de Le Corbusie
No entanto
o verdadeiro objectivo do urbanismo será conseguir resolver os problemas que
afetam as cidades, qualificando os espaços, criando infra-estruturas e
promovendo a melhoria das condições de vida, entre os elementos construídos e
as várias partes da cidade, visando uma melhoria estética, da qualidade de
vida, da segurança e do conforto.
Do
Congresso Internacional de Arquitetura Moderna (CIAM), em Atenas, resultou a
publicação de um documento, em 1943, onde se estabeleciam os princípios do
urbanismo moderno - a Carta de Atenas.
Em termos
de desenho urbano, há um rompimento com as formas tradicionais, como a
organização em quarteirão da cidade histórica. Este novo modelo de cidade
baseia-se em princípios funcionalistas: habitação, circulação, trabalho e
divertimento, sendo Le Corbusier o seu principal mentor. Preconizam a criação de
edifícios em altura (torres), dispostos no terreno em função de uma boa
orientação solar, de boas condições de arejamento e facilidade de acessos. O
espaço entre edifícios seria utilizado como zona verde ou parque de uso
público. As vias de circulação seriam hierarquizadas e pretendia-se estabelecer
uma separação entre veículos e pedestres. Estas ideias vão influenciar a
produção urbanística mundial no período pós-guerra até à década de 70.
Entre
outras propostas revolucionárias da Carta está a de que todo o solo urbano da
cidade pertence ao município, sendo, portanto público.
Plano
da cidade de Brasília, cujo plano piloto é de autoria do arquiteto e urbanista
brasileiro Lúcio Costa aplica integralmente todos os princípios da Carta
O urbanismo
contemporâneo procura integrar a urbe histórica e a cidade moderna analisando e
estudando as diferentes formas de fazer cidade, numa estratégia de planeamento
que valorize o que elas têm de melhor, requalificando as áreas que entretanto
se degradaram por ação do tempo, do uso ou pela desarticulação com novas
exigências funcionais.
A tarefa
dos urbanistas será a de alcançar um equilíbrio, entre as edificações e as
áreas verdes, através das transformações que podem ocorrer num determinado
espaço urbano, sempre na procura de caminhos para melhorar a qualidade de vida
dos cidadãos.
Hoje, o
urbanismo é uma ferramenta fundamental para o planeamento das cidades, a sua
intervenção, para além das preocupações sócio-económicas e ambientais, também é
a de conceber espaços esteticamente apelativos, aptos a formarem-se como pólos
dinamizadores e de atração a atividades economicamente lucrativas e
promotores de uma convivência social equilibrada.
Teresa Beyer
Sem comentários:
Enviar um comentário