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sexta-feira, 9 de maio de 2014

VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

Não é de homem!
Há poucos dias uma advogada foi assassinada, em Estremoz, pelo marido duma sua constituinte, a quem tratava do divórcio. Alegadamente, o homem não terá gostado da maneira como a advogada de cinquenta anos defendia a sua cliente e esposa do homicida e, depois da ameaça, matou a advogada. 
O caso chocou-me particularmente. Não por se tratar duma advogada, mas sim por se tratar de mais um passo na escalada do flagelo da violência doméstica em Portugal.
A violência doméstica deixou os domínios da coação física e psicológica exercida durante anos, ultrapassou o campo da violência física brutal e instalou-se na esfera do crime. A notícia já não é feita de agressões mas de mortes.
Na minha opinião, a sociedade portuguesa tem de olhar para este problema de forma corajosa e intervir a vários níveis sem contemplações, para que daqui a poucos anos estas mortes sejam apenas referidas como uma estatística e não como uma tragédia.
Tenho muita dificuldade em entender qualquer razão que justifique a violência dum homem sobre uma mulher, porque simplesmente essa razão não existe. Em primeiro lugar, porque muito raramente a violência é justificável como meio de resolver um conflito; depois, porque a violência exercida sobre um ser humano mais frágil fisicamente é um ato de cobardia e de menoridade intelectual e afetiva; e, finalmente, porque quem ama ou amou uma mulher jamais poderá encontrar na violência uma maneira de extravasar as suas mágoas, frustrações, raiva ou ódio.
A violência desqualifica quem a pratica e coloca-o ao nível da besta. É inconcebível que uma sociedade escolarizada, como é a portuguesa, ainda continue a produzir estas aberrações. Não é uma questão de falta de cultura académica nem de excesso de violência nos meios de comunicação social. Essa violência existe, mas é residual. Também não me parece bem que o alcoolismo de alguns energúmenos explique tudo. Essa é uma justificação minoritária.

A explicação está na cultura social que produzimos. É uma cultura oportunista, cheia de “encolher de ombros”, de falta de coragem e de falta de ação. Muitas vezes, penso que estes temas só interessam verdadeiramente a quem sofre estes dramas: mulheres, filhos, amigos mais chegados. Ora não é preciso vivenciar o terror para o rejeitar veementemente. E a rejeição deste tipo de comportamentos tem de se ser explícita e ativa. Os adolescentes e jovens têm de ser decididos na rejeição da violência no namoro, jamais desculpabilizando o agressor ou silenciando a agressão. Amar alguém nunca significará fechar os olhos à violência, amar alguém tem de ser também não perder a dignidade nem o amor-próprio. Os proto-agressores devem ver desde o primeiro momento a reprovação da sua atitude animalesca.
A escola tem um papel relevante nesta cruzada. A violência doméstica e no namoro já é tema tratado pelos nossos adolescentes no ensino básico, mas é fundamental sê-lo de maneira mais incisiva no ensino secundário e no universitário. Não se pode pensar que tal ação representa uma menorização das jovens ou uma humilhação dos rapazes. Há que ser proativo e assertivo: se há cada vez mais violência doméstica é porque a prevenção falhou. Os homens que hoje agridem aos 30, 40 0u 50 anos foram adolescentes e jovens, em quem a escola e a sociedade confiaram cegamente e… erradamente. Os erros corrigem-se, sem pejos nem vergonhas. 
A isto acresce, em meu entender, uma medida fundamental: é preciso os homens estarem na primeira linha do combate. Devem ser eles a envergonhar, condenar, punir socialmente aqueles que enxovalham, coagem e agridem uma mulher.
Não é a sua presença física que inibe os agressores (ainda que tal não seja despiciendo), mas a sua condenação moral inequívoca que faz recuar as garras do agressor e até lhes pode cortar as unhas para sempre.
É necessário sarar muitas feridas, repor a auto-estima de milhares de pessoas, recuperar o prazer de viver e de amar.  
A luta contra a violência doméstica é também uma luta dos homens pela sua dignidade e pela liberdade.

Gabriel Vilas Boas

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