O Auto da Barca do Inferno de Gil
Vicente é a peça de teatro mais conhecida, mais estudada e das mais importantes
do teatro português.
Tal
facto deve-se, em grande parte, a ser ensinada nas escolas portuguesas, de modo
obrigatório, há muitos anos. No entanto, isso apenas serve para confirmar o seu
grande valor cénico, literário, histórico e sociológico.
Na
minha opinião, o Auto da Barca do Inferno, escrita em 1517 por Gil Vicente, triunfa, em grande
medida, por acertar plenamente naquilo que deve ser a função do teatro:
intervir socialmente e divertir o público. Quando essa combinação é feita na
dose certa (como é o caso), temos um texto dramático que encanta gerações e
gerações de pessoas ao longo dos séculos.
No Auto da Barca do Inferno, Gil
Vicente crítica a sociedade portuguesa do século XVI através das célebres personagens-tipo,
que representavam classes sociais e grupos profissionais. O Fidalgo surge como
o representante da nobreza vaidosa, tirana e imoral que despreza os humildes; o
Onzeneiro representa a burguesia materialista e gananciosa; o Frade aponta aos
defeitos do clero medieval e renascentista: mundano, imoral e dedicado aos
prazeres da vida; o Corregedor e o Procurador ilustram o aparelho judicial parcial,
corrupto e subornável; a Alcoviteira simboliza a vida imoral, hipócrita e
mentirosa que grassava em grande parte da população; o Sapateiro lembra todos
aqueles que se assumiam como católicos mas que não praticavam a verdadeira
religião.
Depois
temos a personagem do Parvo que se encarrega de trazer a diversão à peça de
mestre Gil. Grande parte do cómico de linguagem sai da sua boca.
Outro
aspeto muito saliente nesta peça do tempo dos Descobrimentos é a maneira como se
usa a ironia. Ela tanto serve para criticar com classe, como para fazer rir ou
apenas sorrir.
Apesar
da peça retratar com acutilância a sociedade portuguesa da primeira metade do
século XVI, a sua temática tornou-se intemporal e universal, porque os defeitos
daquelas personagens-tipo são mais do que pecados típicos de classes sociais ou
grupos profissionais, são defeitos do ser humano. Por isso, hoje, podemos
encontrar outros “tipos” a quem aquele fato serve na perfeição. O banqueiro, o
político, a vedeta de televisão…
Não é
uma ousadia afirmar que através do Auto da Barca do Inferno vemos mais do que uma época histórica, observamos o ser
humano perante as suas fraquezas típicas: o poder, o dinheiro, o prazer.
Percebemos
ainda que há povos, como o judeu, que ainda hoje são aceites com alguma
relutância e anotamos o decréscimo de importância da religião cristã na vida
das pessoas.
Não
podemos deixar de assinalar também a qualidade literária do texto, na profusão
e variedade de recursos estilísticos, nos jogos de palavras, na riqueza e
variedade dos registos de língua. Tudo isto construído com uma língua em
mutação e com uma literatura ainda incipiente… há quase quinhentos anos.
Quanto
à relevância cénica da peça é por demais evidente. Na época representou um
grande avanço, sobretudo no tratamento das personagens. Hoje constitui uma
referência para enquadrar os mais novos nas especificidades do texto dramático.
O Auto da Barca do Inferno é uma
estrela brilhante no firmamento do teatro português que, com o passar dos anos,
adquire um brilho cada vez mais intenso.
Gabriel
Vilas Boas
"AUTO DA BARCA DO INFERNO" DE GIL VICENTE, O TEXTO DRAMÁTICO MAIS LIDO DA LITERATURA PORTUGUESA!!! É UMA COMPLEXA ALEGORIA DRAMÁTICA... GIL VICENTE CONSEGUE TORNAR O AUTO NUMA PEÇA TEATRAL! É COMO DIZES GABRIEL: É UMA ESTRELA BRILHANTE DO TEATRO QUE, VAI ADQUIRINDO UM BRILHANTE CADA VEZ MAIS INTENSO. GOSTEI MUITO DE RELER. PARABÉNS GABRIEL!
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