João Tordo é um escritor que não gosta de holofotes.
Serenamente, sempre num tom coloquial, por vezes até calmo de mais, lá foi
explicando à plateia que o seu último livro “O Deslumbre De Cecília Fluss”
encerra uma trilogia (os outros dois são “Luto de Elias Grou” e “O Paraíso
Segundo Lars D.) que na verdade devia chamar-se um tríptico, pois não há uma sequência narrativa entre as três histórias, mas apenas um cimento temático que
os une.
Pacientemente explicou que “Deslumbre de Cecília Fluss”
tinha como protagonista um adolescente de catorze, imensamente preocupado com
sexo, um tio enlouquecido e fábulas budistas.
Às tantas a conversa derivou para a adolescência, esse período
em que tudo é difícil de compreende, onde nasce a urgência de viver a
juventude, onde se confundem desejo e sofrimento. E onde começa o medo. O medo
de não ser amado, de não ser aceite, de não conseguir triunfar. Talvez do medo
nasça a urgência, talvez do medo nasça a ação e a inação, talvez sim, talvez
não… como diria João tordo como inegável bonomia e suave humor.
E lembrei-me, então, que a adolescência é só o princípio do
reinado do medo. Ele ficará sempre connosco como uma sombra vigilante,
acusatória, fria. Umas vezes chamar-se-á consciência, outras obstáculo, outras vezes
encruzilhada da vida. Um dia aliado, muitos outros empecilho. Havemos de o
lamentar, de o culpar, mas poucas vezes de o vencer.
O medo é aquele tipo que poucas vezes olhamos nos olhos. E
é pena, porque ele também deve ter medo que um dia deixemos de o temer.
GAVB
Em contexto familiar favorável, as crianças vencem naturalmente os normais obstáculos que se lhes vão deparando, alicerçando assim a sua estrutura psíquica; já na adolescência, o jovem tem necessidade de construir e consolidar o seu próprio conceito de identidade pessoal a caminho do social. A imagem que os outros têm de si conta, bem como a sua integridade sexual, a sua intelectualidade, a sua aceitação grupal e o seu sex-appeal (poder de sedução ou magnetismo pessoal). Os pais pertencem já a outra era; agora é ele quem precisa de se afirmar livre, autónomo, independente, emancipável, com ideias próprias, ou, convenhamos, a caminho destes mesmos pressupostos conceptuais. Evidentemente que ninguém ousa, antes de consultar, devidamente, a sua consciência (luz reguladora). Ora, caso não existisse medo algum a refrear os impulsos, também não se verificaria o necessário equilíbrio entre o instinto de vida e o instinto de morte, nem tão-pouco seríamos dotados de uma consciência alargada e actuante.
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