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segunda-feira, 24 de março de 2014

DA ARTE, DA PINTURA, DO PÓS-MODERNISMO EM LUÍSA MOTA

“O pós-modernismo é um movimento contemporâneo. É forte e está na moda. E, sobretudo, não é completamente claro o que ele é. Na verdade, a claridade não se encontra entre os seus principais atributos. Ele não apenas falha em praticar a claridade mas em certas ocasiões até a repudia abertamente…”
Ernest Gellner

Hoje quero falar-vos apenas de Arte. A Pintura, essa admirável manifestação artística superior, vai ficar por isso em suspenso, e não vamos acordar os grandes mestres de outros tempos e as suas pequenas manias, vícios e grandezas, as suas belas obras-primas, os seus mecenas, as suas musas inspiradoras, nem interferir na azáfama poética e visual das suas oficinas e ateliers...
É que o século XXI está aí, com a garra e a força de um qualquer outro século, empurrado pela energia aglutinadora das suas gentes inspiradas e criativas, pleno também de emoções que se transpõem de forma inovadora para novos e inesperados suportes trazidos por ventos bem providos de tecnologias plurais, virtuais, multidisciplinares.
Eric Hobsbawm, na sua obra A Era dos Extremos, sobre o séc. XX, publicada em 1994 ,e que muito aprecio, dá-nos conta numa linguagem simples mas assertiva, do desastre dos  imperialismos, dos estados comunistas ou capitalistas, da falência dos nacionalismos, da Grande Depressão e crises que a todos afetam, da crise da arte, num mundo cada vez mais globalizado. Termina o século XX, que se disse do Povo, e a insegurança e instabilidade permanecem, assim como os problemas, alguns já diagnosticados no século anterior: guerras civis, conflitos regionais, o aumento da população em países subdesenvolvidos, a poluição, o terrorismo internacional, o esgotamento dos recursos naturais. Estes problemas afligem-nos mais hoje, já que nos chegam através de meios de comunicação sofisticados, intensificando-se assim a massificação da cultura e da informação, bem formatada  a gosto e, às vezes, por encomenda.
E é aqui que entra também o computador e a Internet na Arte. Surgem hoje autênticos museus virtuais onde  a cada visita, somos invadidos por ideias novas, por artistas em rede e por uma Arte a que apelidamos de Pós-Moderna, entre outras. As exposições estão connosco, à distância de um clique, em permanente busca existencial que já se evidenciava timidamente com Marcel Duchamp. Arte ou anti - Arte? Qual o propósito atual da Arte? Apenas PROVOCAR? Qual o valor da Arte e dos seus objetos?
A segunda metade do séc. XX viu nascer a arte-acontecimento, segundo a ideia de que a arte não deve representar a vida, mas antes envolver-se nela, fazer parte dela. E assim, um pouco por toda a Europa e Estados Unidos da América explode o happening, a performance, a instalação. John Cage e Merce Cunningham criam uma arte que integra música, vídeo, fotografia, teatro, dança, abrindo portas de forma inusitada à experimentação, agora multidisciplinar. A estética do espetáculo, presente na performance, mas também no happening, a valorizar a ideia e a criação artística em detrimento do produto final, está viva e comunica com o público, de uma forma tão intensa que muitas vezes até estimula a sua participação. E é tão efémera, por vezes.
A Minimal Art, a Arte Conceptual, a Land Art e a Arte Cinética vinham também já exigindo a participação do espetador, sobretudo esta última e a Op Art, que convocavam o público a involuntariamente experimentarem a sua sensibilidade percetiva.
No entanto, o séc. XX, rico em crises variadas, também viveu a crise das suas mais importantes vanguardas. E hoje, o pós-modernismo absorve todas as influências e estilos marcantes do século anterior, onde os mais díspares artistas se inspiram para intervir na sociedade atual e para, de forma eclética e multifacetada, refletirem a sua época que um dia há - de ser estudada(e asseguro-vos que terá de ser tarefa de gigantes).Esta pós-modernidade existe apenas nas sociedades capitalistas pós-industriais e é, portanto, a sua vertente cultural. É uma arte superficial, que defende as narrativas de curta duração, o provisório, o temporário, sob o primado da tecnologia e que não se quer espartilhada por epítetos ou nomenclaturas.
E é aqui que entra um nome, já lançado e bem apreciado no mundo da Arte dos nossos dias, Luísa Mota. Nascida no Porto, em 1984, mas com ascendência em terras de Amarante, que também a molda e influencia, é um talento de rara inspiração e criatividade. Também ela, tal como Amadeo, uma workaholic sempre envolvida em novos projetos que a tomam de assalto. Também ela, como Amadeo vive a uma velocidade vertiginosa, a cada dia num fuso horário diferente, onde as diferentes experiências sensoriais que vive nos quatro cantos do planeta se derretem e misturam na sua obra criativa, dando-lhe laivos de modernidade. A sua casa do Porto, onde de quando em vez aterra, para um descanso num Olimpo carregado de afetos, outrora habitação da grande Aurélia de Sousa também a inspira, quem sabe a mando daquela artista do naturalismo, a denotar influências realistas ,impressionistas e até pós-impressionistas. Que feliz estará Aurélia com este elegante talento criador, como ela precursora de movimentos da inovação.
Seduziu com um portfolio extraordinário, revelador de um dom único para o desenho e a captura de instantes carregados de significação, quer na Wimbledon College of Art, quer na Goldsmiths University of London, onde estudou Artes Visuais e se preparou com afinco para a atividade artística que agora desenvolve e que se divide entre países como a Inglaterra, Portugal e Brasil.
Integrou diversos group shows em Londres e Alemanha e apresentou diversos trabalhos na Galeria Fernando Santos, Porto. Podemos encontrá-la igualmente na The Saatchi Gallery, em Londres, que apostou nesta artista, comprando-lhe obras.

Luísa Mota, 'Poster dos Homens Invisíveis, 238 x 400 cm, impressão digital sobre papel, 2012,The Saatchi Gallery, Londres

A sua obra caracteriza-se por uma linguagem essencialmente performativa e narrativa, onde explora situações reais e do quotidiano, quer na fotografia, onde é exímia, quer no vídeo ou na instalação. A realidade é portanto o seu suporte conceptual. Explora o improviso, em performances que idealiza num misto de cenografias bailadas, muitas vezes em espaços urbanos abandonados e esquecidos, onde emerge a Vida no seu fulgor de que deixo aqui um pequeno registo fotográfico, da Possibilities of Surrender, que teve lugar na Galeria Fernando Santos, em 2007,na inauguração da Miguel Bombarda e a que tive o privilégio de assistir.
 

Possibilities of Surrender (01),Luisa Mota
woodcarving, oil stick on plywood, 170 x 125 x 2 cm, 2007
(detail),Galeria Fernando Santos, Porto

Sobre o projeto Hold Your Horses, também apresentado na galeria Fernando Santos, Luísa Mota escreveu:
“Quatro mulheres. Três variações da mesma e uma enfermeira. Um espelho, um lago. Uma mulher no lago. Cordas que atravessam e marcam o espaço. Luz que nasce, pára e liga todos estes elementos num meio círculo, e que se espera que este se conclua noutro espaço paralelo. Um jogo de associação que aceita e ao mesmo tempo distorce convicções. “
Hold Your Horses é uma instalação circunscrita a um espaço que sugere uma narrativa onde o tempo está em suspensão.”O suspense de uma ação suspensa”, com mulheres no centro da ação.
Visitei quase todas as suas exposições, que apreciei e interpretei a meu modo, guiada pelo pouco que sei da arte do meu tempo, tão enigmática quanto convidativa . De todas, a instalação Hold Your Horses foi uma das que mais apreciei. Para mim, retrata a vida em suspenso de tantas mulheres…os seus múltiplos papéis, exigidos por uma sociedade pouco igualitária e as suas opções que por vezes podem até passar pelo precipício. O compasso de espera, fatídico…Para refletir.
Espero não ter defraudado os nossos leitores, por trazer a pós- modernidade da obra da minha Luísa e a sua sensibilidade exposta nos vídeos e instalações que realizou. Espero também que o Gabriel não me leve a mal por ter fugido hoje ao tema que me foi proposto. E espero também que a Luísa aprecie o texto que para ela escreveu a tiinha de Amarante ,mesmo em vésperas do seu aniversário. Sim, a Luísa também nasceu em março, tal como o Botticelli do texto anterior e, coincidência das coincidências, tal como eu. Claro que só podemos todos ser boas pessoas. Imparável, terminou no Verão passado o Mestrado no Royal College of Arts, em Londresonde apresentou na exposição de final de curso a performance “My jewellery shines but you can't see my eyes”. Por agora, a Luísa Mota está pelo Brasil, a trabalhar para a próxima exposição a ter lugar na Baía. Boa sorte, querida Luisinha.



                                                 “My jewellery shines but you can't see my eyes”

E é tudo por hoje…deixo - vos com o link dum vídeo que mostra a performance “My jewellery shines but you can’t see my eyes”, de 2013, onde uma “Goddess Woman silk piece” é personagem principal, manuseada por três performers.

https://vimeo.com/74035297
Exposições Individuais
2014 Temporada de Projetos 2014, Paço das Artes, São Paulo
2013 I believe in good things coming, The Mews, Londres
2012 Déjà vu/me somewhwer now,V22,Londres
2010 Going Deeper (curadoria de Miguel Amado), fundação PLMJ, Lisboa
2010 Hold Your Horses,Galeria Fernando Santos, Porto

2008 Julie Series, Galeria Fernando Santos, Lisboa 
Exposições coletivas
2014 3ª Bienal da Bahia, Salvador
2014 Contentores, Museu da Eletricidade, Lisboa
2013 I Believe in Good Things Coming, Verbo, Galeria Vermelho, S.Paulo
2013 21st Century Art and Design-RCA 2013 (curadoria de Ute Meta Bauer)
2013  Christie’s, Londres,MA Degree Show, Royal College of Art, Londres
2011 Videoholica, Varna, Bulgaria
2011 Athens Video Art Festival, Atenas
2010 A-L-L-O-T-M-E-N-T-S, Schwartz Gallery, Londres
2008 On Indefiniteness, Halle 14,Spinerei, Leipzig
2007 BA Degree Show, Goldsmiths College, Londres
2007 Projektor,Café Gallery Projects,Londres
2006 Open Exhibition, Café Gallery Projects, Londres 

Rosa Maria Alves da Fonseca
                

3 comentários:

  1. Belas Pinturas!!! À Artista, pós- modernista Luísa Mota, Parabéns. Mais um texto excelente! Gostei. Parabéns.

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  2. Sim, Ana, pinturas muito bonitas. A Rosa Maria está sempre a descobrir artistas e a dá-los a conhecer.

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  3. Muito obrigada, Ana. A Luísa Mota pinta muito bem, embora eu aqui tenha deixado apenas um registo de um pormenor de uma pintura a óleo sobre madeira, de uma obra de grandes dimensões que a artista produziu para integrar a performance Possibilities of Surrender. A fotografia não faz jus à beleza do painel nem mostra o impacto fortíssimo que este exercia sobre o público.Ficará para uma outra altura um texto sobre a nova fase pictórica da Luísa. Assim haja tempo e inspiração.

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