Etiquetas

segunda-feira, 10 de julho de 2017

ENTREVISTA A VALTER HUGO MÃE (I)


No passando sábado, Valter Hugo Mãe visitou a cidade de Amarante, a convite da associação cultural Gatilho, para apresentar o seu mais recente livro, “Homens Imprudentemente Poéticos”. No final, o autor concedeu-me uma breve entrevista, cuja primeira parte é hoje publicada.

Escritor, editor, artista plástico, cantor, apresentador de televisão… Quase um artista total. Aconteceu por acaso ou tinha esse secreto desejo de ser várias coisas em simultâneo?
Escritor não! Escritor é um veio fundamental que me estrutura e justifica! Todas as outras aconteceram, porque, num dado momento, alguém se lembrou de me desafiar e eu desafiado sou um problema (risos). Não sei muito ficar quieto. 
Tenho a convicção que as artes comungam entre si de uma mesma fúria. Eu nunca serei um artista plástico, mas quando desenho ou quando observo o trabalho de alguém consigo perceber-lhe a mesma fúria que me acomete, a mesma felicidade. 


Que importância têm as viagens, o estar noutros lugares e com outras gentes naquilo que escreve?
As viagens oferecem-me outros pontos de vista, oferecem-me as palavras repensadas. Mesmo nas línguas que eu não domino, por vezes, eu consigo pressentir determinadas texturas de linguagem que acabam por influenciar a maneira como eu escrevo. A viagem permite a observação de uma poética, não só dos lugares, mas também da maneira como as pessoas se expressam; como elas podem gerir as suas vidas com uma economia vocabular muito distinta da nossa. 
Por exemplo, os islandeses têm um «sim» que é só um som aspirado. É interessante perceber que uma palavra pode ser uma forma de respiração.  

As culturas longínquas (Islândia, Brasil, Japão) são um filão artístico ou uma paixão incontrolável?
É uma coisa profunda e de sempre. É uma necessidade de me completar, fazendo apelo a culturas que não a minha. Tenho a convicção que a minha cultura só ganha sentido quando a posso colocar ao lado da cultura dos outros. Tudo aquilo que nos pode parecer lógico e simples é problematizado e repensado quando o comparamos com a cultura de outros povos. Por vezes, acabamos por cometer erros ao pensar que temos a melhor maneira de fazer ou de pensar. Esse confronto com culturas distantes oferece a humildade de acharmos que o nosso lugar é só o nosso lugar. Nem melhor nem pior.

É verdade que o seu próximo livro é sobre a Baía e os baianos? O que o seduz na terra de Jorge Amado?
É verdade que vou escrever sobre o Brasil. Quando estive na Baía fiquei tão destrambelhado com a maravilha da Baía que, se a minha vida mo tivesse permitido, tinha escrito naquelas semanas seguintes tudo quanto conseguisse, porque vim de lá tão impressionado que uma história baiana imediatamente tomou conta de mim.

Eu quero muito escrever sobre o Brasil. Há muitos anos (muito antes de lá ir), eu queria abeirar-me da mundividência brasileira, mas quero fazê-lo quando isso seja da natureza da minha escrita e não como uma retribuição ou uma manifestação de gratidão. Quero que o livro seja genuíno! É como gostar de uma mulher: quero gostar dela por gostar e não por ela gostar de mim. 
GAVB
Fotografias: Elsa Cerqueira
(Continua)


Sem comentários:

Enviar um comentário