No passando sábado, Valter Hugo Mãe
visitou a cidade de Amarante, a convite da associação cultural Gatilho, para
apresentar o seu mais recente livro, “Homens Imprudentemente Poéticos”. No
final, o autor concedeu-me uma breve entrevista, cuja primeira parte é hoje
publicada.
Escritor,
editor, artista plástico, cantor, apresentador de televisão… Quase um artista
total. Aconteceu por acaso ou tinha esse secreto desejo de ser várias coisas
em simultâneo?
Escritor não! Escritor é um veio fundamental que me
estrutura e justifica! Todas as outras aconteceram, porque, num dado momento,
alguém se lembrou de me desafiar e eu desafiado sou um problema (risos). Não
sei muito ficar quieto.
Tenho a convicção que as artes comungam entre si de uma
mesma fúria. Eu nunca serei um artista plástico, mas quando desenho ou quando
observo o trabalho de alguém consigo perceber-lhe a mesma fúria que me acomete,
a mesma felicidade.
Que
importância têm as viagens, o estar noutros lugares e com outras gentes naquilo
que escreve?
As viagens oferecem-me outros pontos de vista, oferecem-me
as palavras repensadas. Mesmo nas línguas que eu não domino, por vezes, eu
consigo pressentir determinadas texturas de linguagem que acabam por
influenciar a maneira como eu escrevo. A viagem permite a observação de uma
poética, não só dos lugares, mas também da maneira como as pessoas se
expressam; como elas podem gerir as suas vidas com uma economia vocabular muito
distinta da nossa.
Por exemplo, os islandeses têm um «sim» que é só um som
aspirado. É interessante perceber que uma palavra pode ser uma forma de
respiração.
As
culturas longínquas (Islândia, Brasil, Japão) são um filão artístico ou uma
paixão incontrolável?
É uma coisa profunda e de sempre. É uma necessidade de me
completar, fazendo apelo a culturas que não a minha. Tenho a convicção que a
minha cultura só ganha sentido quando a posso colocar ao lado da cultura dos
outros. Tudo aquilo que nos pode parecer lógico e simples é problematizado e
repensado quando o comparamos com a cultura de outros povos. Por vezes, acabamos
por cometer erros ao pensar que temos a melhor maneira de fazer ou de pensar.
Esse confronto com culturas distantes oferece a humildade de acharmos que o
nosso lugar é só o nosso lugar. Nem melhor nem pior.
É
verdade que o seu próximo livro é sobre a Baía e os baianos? O que o seduz na
terra de Jorge Amado?
É verdade que vou escrever sobre o Brasil. Quando estive
na Baía fiquei tão destrambelhado com a maravilha da Baía que, se a minha vida
mo tivesse permitido, tinha escrito naquelas semanas seguintes tudo quanto
conseguisse, porque vim de lá tão impressionado que uma história baiana
imediatamente tomou conta de mim.
Eu quero muito escrever sobre o Brasil. Há muitos anos
(muito antes de lá ir), eu queria abeirar-me da mundividência brasileira, mas
quero fazê-lo quando isso seja da natureza da minha escrita e não como uma
retribuição ou uma manifestação de gratidão. Quero que o livro seja genuíno! É
como gostar de uma mulher: quero gostar dela por gostar e não por ela gostar de
mim.
GAVB
Fotografias: Elsa Cerqueira
(Continua)
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