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sexta-feira, 2 de junho de 2017

PARA SEMPRE (IM)PURO


O Beitar de Jerusalém é um dos mais populares clubes de Israel. Há cerca de uma década foi comprado pelo magnata russo Arcadi Gaydamak. Homem habituado aos negócios (lícitos e ilícitos), Gaydamak resolveu, em 2012, contratar dois jogadores chechenos muçulmanos para a equipa de futebol.
As reações foram brutais. A principal claque do clube – La Famiglia – ficou em polvorosa com a medida do novo proprietário e resolveu retaliar.  Quando o checheno Sadayev marcou o seu primeiro golo pelo Beitar, dando a vitória ao clube israelita, os membros da La Famiglia abandonaram o estádio em protesto contra aquela vitória ultrajante. Como poderiam ganhar um jogo que fosse graças a um golo de um muçulmano?


Jogo após jogo o boicote ao apoio à sua própria equipa tornou-se cada vez mais intenso e os jogadores ressentiram-se disso, pois as derrotas foram-se acumulando e começou a pairar o perigo de descida de divisão. Nem assim os adeptos voltaram. Entre os poucos que assistiam aos jogos podia ouvir-se o grito “Morte aos muçulmanos” e em várias zonas do estádio figurava a faixa odiosa: “Para sempre puros”.
Como não lembrar Hitler e uma das principais razões evocadas para o Holocausto: a pureza da raça! Ora os filhos dos sobreviventes do Holocausto evocam o mesmo princípio para proclamar a morte aos árabes. Como é irónica e paradoxal a História e... o ser humano!

O boicote dos ultra do Beitar só foi interrompido num jogo crucial e altamente simbólico para o Beitar – a partida contra o Bnei Saknin, o único clube árabe da primeira divisão israelita. O empatou salvou o Beitar da descida, mas nem assim a Famiglia abrandou no seu terrorismo sobre os chechenos do clube.
Depois dessa época negra, nada ficou igual no Beitar: os chechenos, obviamente, foram jogar para outro clube; Gaydamak vendeu a equipa, o treinador e o capitão foram despedidos e a claque tornou-se num movimento político xenófobo.

Muitas vezes o futebol não é mais do que a caricatura da sociedade em que nos tornámos. As claques assumem um protagonismo e um poder ilegítimo, impuro e perigoso. A princípio parece apenas uma brincadeira de gente malformada e boçal, mas rapidamente aqueles atos trogloditas se tornam em algo perigoso e descontrolado que mancha a essência de fair play que caracteriza o jogo bem como o respeito pelo outro em todas as suas dimensões.
“Para Sempre Puro” é o reflexo de um ódio que não entendo; de um ódio brutal  e bruto que domina dois povos há centenas de anos e que contamina tudo por onde passa.
Desisti de entendê-lo, porque a irracionalidade não se entende, combate-se. Sem armas, sem retaliações, apenas com exemplos de paz e respeito.

GAVB

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