O Beitar de Jerusalém é um dos mais populares clubes de Israel. Há cerca de uma década foi comprado pelo magnata russo Arcadi
Gaydamak. Homem habituado aos negócios (lícitos e ilícitos), Gaydamak resolveu,
em 2012, contratar dois jogadores chechenos muçulmanos para a equipa de
futebol.
As reações foram brutais. A principal claque do clube – La Famiglia
– ficou em polvorosa com a medida do novo proprietário e resolveu retaliar. Quando o checheno Sadayev marcou o seu
primeiro golo pelo Beitar, dando a vitória ao clube israelita, os membros da La
Famiglia abandonaram o estádio em protesto contra aquela vitória ultrajante.
Como poderiam ganhar um jogo que fosse graças a um golo de um muçulmano?
Jogo após jogo o boicote ao apoio à sua própria equipa
tornou-se cada vez mais intenso e os jogadores ressentiram-se disso, pois as
derrotas foram-se acumulando e começou a pairar o perigo de descida de divisão.
Nem assim os adeptos voltaram. Entre os poucos que assistiam aos jogos podia
ouvir-se o grito “Morte aos muçulmanos” e em várias zonas do estádio figurava a faixa odiosa: “Para sempre puros”.
Como não lembrar Hitler e uma das principais razões evocadas
para o Holocausto: a pureza da raça! Ora os filhos dos sobreviventes do
Holocausto evocam o mesmo princípio para proclamar a morte aos árabes. Como é
irónica e paradoxal a História e... o ser humano!
O boicote dos ultra do Beitar só foi interrompido num jogo
crucial e altamente simbólico para o Beitar – a partida contra o Bnei Saknin, o
único clube árabe da primeira divisão israelita. O empatou salvou o Beitar da
descida, mas nem assim a Famiglia abrandou no seu terrorismo sobre os chechenos
do clube.
Depois dessa época negra, nada ficou igual no Beitar: os
chechenos, obviamente, foram jogar para outro clube; Gaydamak vendeu a equipa,
o treinador e o capitão foram despedidos e a claque tornou-se num movimento
político xenófobo.
Muitas vezes o futebol não é mais do que a caricatura da
sociedade em que nos tornámos. As claques assumem um protagonismo e um poder ilegítimo,
impuro e perigoso. A princípio parece apenas uma brincadeira de gente malformada
e boçal, mas rapidamente aqueles atos trogloditas se tornam em algo perigoso e
descontrolado que mancha a essência de fair play que caracteriza o jogo bem
como o respeito pelo outro em todas as suas dimensões.
“Para Sempre Puro” é o reflexo de um ódio que não entendo;
de um ódio brutal e bruto que domina
dois povos há centenas de anos e que contamina tudo por onde passa.
Desisti de entendê-lo, porque a irracionalidade não se
entende, combate-se. Sem armas, sem retaliações, apenas com exemplos de paz e
respeito.
GAVB
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