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quarta-feira, 24 de agosto de 2016

ESTAGIÁRIO A FAZER DE OTÁRIO


Há um mês escrevi um post irónico intitulado “Os Patrões Exigem”, onde pretendi destacar a atitude algo arrogante do patronato português no diálogo que mantinha com o governo da República, tratando-o como se este fosse um seu subordinado. Esta semana, o Conselho Nacional da Juventude denunciou uma prática ilegal e, sobretudo, imoral de alguns patrõezinhos portugueses sobre os jovens estagiários.
Para incentivar a contratação de jovens licenciados, o governo patrocina o seu salário em cerca de 700 euros, cabendo ao empresário apoiado acrescentar cerca de 50% deste valor à folha salarial do estagiário de maneira a que este jovem, altamente qualificado, tenha um salário minimamente compatível com as suas competências e habilitações.
E o que fazem os espertalhões dos patrões? Obrigam os seus jovens empregados estagiários a deslocarem-se ao multibanco e levantarem cerca de 35% do valor atribuído pelo Estado e a entregá-lo em numerário (para que não haja provas da marosca) à empresa onde trabalham. Os jovens estagiários têm ainda de pagar do seu bolso a totalidade do desconto para a Segurança Social quando o que diz a lei a esse respeito é que o pagamento tem de ser solidário entre empregado e empregador.

Com este esquema, o estagiário trabalha por 65% do valor que supostamente é o seu salário e estes patrões pagam pouco mais de 150 mensais por um trabalhador altamente qualificado. Se fizermos as contas ficam a um euro por hora.
Esta trafulhice, esta completa subversão das regras de apoio à contratação de jovens licenciados passa impune porque os jovens atingidos estão numa posição de enorme fragilidade, caso denunciem o esquema ilícito, e têm dificuldade em prová-lo porque o dinheiro entre em numerário na empresa.
Lamento que o governo e  as autoridades fiscais não atuem rápida e eficazmente sobre estes espertalhões, que os sindicatos não amplifiquem a denúncia do CNJ e, especialmente, que o meu país tenha este tipo de “empreendedores” que são um exemplo de sucesso neoliberal à maneira chinesa.
Esta gente nunca empregará um único estagiário como nunca fará crescer a economia. Acredito que estes patrões de vão de escada enriqueçam, mas à custa do esforço e competência dos outros e da inoperância do Estado, que se deixa comer por lorpa. 
Esta é a gente que adora falar em colaboradores em vez de trabalhadores, que abomina contratos de trabalho, mas está sempre a reivindicar apoios estatais às suas prósperas contas bancárias.

Gabriel Vilas Boas 

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