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quarta-feira, 23 de maio de 2018

OS CUS DE JUDAS


O romance de António Lobo Antunes foca o tema da guerra colonial portuguesa e os traumas que ela deixou nos combatentes portugueses.
         Ao longo de todo o romance ressalta o sentimento de revolta perante uma guerra sem sentido, em defesa dum patriotismo balofo e dum regime que a maioria odiava de tão despótico que era.
         A voz do narrador é a voz do autor pois percebe-se que o protagonista é um soldado que foi mobilizado para Angola, exercendo também a função de médico, tal como o autor do romance.
         A narrativa demonstra também o absurdo da guerra colonial, pois percebe-se que os soldados não lutavam por uma causa, não entendiam porque estavam naquele fim do mundo (Os cus de Judas), não partilhavam a ideia de pátria serôdia do Dr. Salazar e seus apaniguados, não sentiam aquele território como seu, não sentiam nos africanos os seus inimigos … em suma, não percebiam por que tinham de matar e morrer por um ideal que não era o seu.
       
  Por outro lado, Os Cus de Judas retratam a dolorosa experiência da guerra colonial a partir da visão de um soldado português que alguns anos depois da guerra ter terminado, retoma as suas memórias sobre a guerra, relembrando factos, histórias, impressões, locais, pessoas e sobretudo sentimentos, aparentemente desconexos (como lhe vinham à memória). Essa recordação é notoriamente dolorosa e parece sempre tão real e tão próxima que ilustra de uma maneira fiel, os traumas que a guerra em África em cerca de um milhão de portugueses que combateram nas ex-colónias portuguesas.

O livro propõe uma reflexão sobre um tempo e uma guerra de guerrilha que marcou uma geração de portugueses, de uma forma indelével. E como o autor muito bem faz notar, a raiva que transparece no livro é também pelo não reconhecimento desses traumas por parte daquele Portugal que ficou a gozar a paz. António Lobo Antunes acentua muito essa ingratidão, esse olhar de lado, como se os combatentes em África fossem doentes mentais, a quem se tivesse de dar um desconto por algumas atitudes mais agressivas. 


O livro é a voz de muitos ex. combatentes que não entendem esse tratamento ingrato, de desprezo , por vezes humilhante a são votados pelos seus compatriotas quando estiveram a dar a vida por eles, numa guerra que nunca quiseram, e que os transtornou de modo irreversível.
         Por outro lado, o romance marca de forma categórica a revolta e muitas vezes o ódio do autor a Salazar e ao regime do Estado Novo, por lhes terem destruído muito mais que a juventude, a confiança de viver.
Gabriel Araújo

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