Ricardo e Catarina estavam de
regresso às aulas. As férias grandes já faziam parte do passado, mas
continuavam bem presentes no espírito de cada um, pois tinham sido as primeiras
após a separação dos pais, que ocorrera logo no início do ano. As marcas daqueles quinze
dias com o pai, no Algarve, ainda estavam bem visíveis no íntimo do sensível filho de
Teresa e Filipe.
Ricardo ainda tem presente a alegria ávida e ansiosa do pai, quando os recebeu em Lisboa, antes de rumar a sul.
Durante seis meses só tinha estado com o pai aos fins-de-semana e ainda assim
não tinham sido todos. Ricardo e a irmã não podiam deixar de reparar como o pai
tudo fazia para lhes agradar, desde a escolha do local de férias, aos restaurantes,
aos pequenos divertimentos. Sentiam-se até um pouco estranhos, mas as suas
vidas tinham ficado estranhas desde a separação dos pais.
Queriam agora lutar pela sua família, mas sentiam-se imponentes, cercados pelas circunstâncias e até pela educação que receberam. Os pais sempre lhes tinham ensinado a lutar lealmente pelos seus sonhos e ideais, mas também lhes mostraram como era importante respeitaras ideias e as decisões dos outros. Por outro lado, percebiam que pai começava a refazer a sua vida sentimental ao lado de outra mulher, Rita, e com ela levava o estilo de vida que sempre desejara fazer com a mãe, mas que esta sempre adiara, tão centrada que estava no trabalho, na carreira e no “futuro”. Agora o futuro já não lhes pertencia, agora o futuro era apenas um conta bancária ao dispor de três pessoas que preferiam ter outro presente.
Pela primeira vez na vida Ricardo experimentava a perda e a
culpa. Percebia agora a verdadeira grandeza do que tiveram e já não tinham. Como
tinham sido gloriosas aquelas férias a quatro durante mais de dez anos; como
era saborosa a presença do pai e da mãe naqueles demorados despertares em
tempos de aulas, como era fantástico aquela mania que o pai tinha de jantarem
sempre juntos, apesar dos atrasos da mãe por causa do trabalho no consultório.
No entanto, Ricardo sentia também a culpa da sua desatenção aos problemas dos
pais. E como ele e a irmã podiam ter sido decisivos e não foram. Demasiado centrados nos
seus interesses e desatentos às necessidades dos outros, não se tinham dado
conta como os pais caminharam para um beco sem saída.
Agora era tarde ou, no mínimo, muito mais difícil…
GAVB
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