A história dos homens está cheia de julgamentos célebres,
por via do estatuto das pessoas em julgamento, dos crimes por elas cometidos ou
por causa da terrível injustiça que o tribunal autorizou, ao condenar um
inocente.
O caso do filósofo grego Sócrates inscreve-se neste último
caso.
Decorria a primavera do ano 399 a.C. quando o grande Sócrates era levado
a tribunal por não acreditar nos deuses, acusado de introduzir novas divindades demoníacas, de corromper os jovens.
Sócrates era um
homem altamente considerado na sociedade ateniense, famoso e respeitado. Ele
acreditava no poder da retórica e na força da convicção e, por isso, toda aquela
acusação lhe parecia um enorme equívoco, um absurdo gigantesco.
Depois dos acusadores falaram, ficou perante o velho sábio
um clepsidra e Sócrates gastou os primeiros minutos da sua defesa com…
silêncio. Na verdade, ele não tinha preparado nenhum discurso e recusara-se a
encomendar a sua defesa aos logógrafos (escritores profissionais de
discursos). Começou por confessar que
aquele local – o tribunal – era estranho para ele. Esse facto causou enorme
perplexidade entre amigos e inimigos. Se uns ficaram nervosos perante a pouca
habilidade do filósofo em se defender de infundadas acusações, outros
aproveitaram para o atacar por não frequentar um lugar de tanto prestígio como
era o tribunal, para os atenienses.
O discurso de defesa de Sócrates sabemo-lo por intermédio de
Platão. Fazendo uso de uma fina ironia mal compreendida, Sócrates negou a sua
sabedoria e sobretudo a capacidade de influenciar negativamente os jovens
atenienses. Não o acreditaram e, apesar de não possuírem provas concludentes
para o condenarem, 361 jurados, contra 140, votaram a condenação à morte do mais emblemático grego da antiguidade clássica.
Como nessa altura decorriam as tradicionais festas em
memória da libertação de Creta do Minotauro por Teseu, Sócrates não foi logo
executado. Enquanto aguardava na prisão, os amigos criaram as condições
propícias para a sua evasão, mas o velho Sócrates negou-se a fugir. Isso derrubaria
a reputação de virtuoso, que alcançara em vida, e, além disso, defendia que a uma
injustiça não se deve responder com
outra injustiça.
Quando chegou o dia, perante amigos e familiares, tomou a
cicuta e bebeu-a até ao fim. Em pouco tempo o veneno fez o efeito esperado e assim se consumava um dos maiores erros da história do Direito.
Lenda ou facto, a
verdade é que se conta que a primeira mulher de Sócrates, quando soube
do processo que moviam ao marido, exclamou indignada:
- Como é possível que te condenem
injustamente?
Ao que Sócrates terá respondido:
- Preferias
que me tivessem condenado justamente?
GAVB
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