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segunda-feira, 12 de setembro de 2016

O MENINO FALTA, O PAI PAGA MULTA?


Uma recente notícia do periódico espanhol El Mundo conta que os pais de uma menina espanhola vão ter de pagar uma multa de 1440 euros pela falta de assiduidade recorrente da sua filha entre 2007 e 2014. 
O tribunal de Palma de Maiorca considerou que aqueles “pais” incorreram em dois crimes: desobediência (tinha sido alertados pela escola para a falta de assiduidade da sua filha e nada fizeram para reverter a situação, apesar de estarem obrigados a mandar a menina à escola) e abandono (a criança ficou abandonada à sua sorte, fazendo o que muito bem lhe apeteceu sem ter maturidade para tal).
Quem lida constantemente com alunos poucos assíduos e encarregados de educação que se demitem da sua função, já pensou muitas vezes, em desespero, nesta medida. 

Como exemplo, como sinal das autoridades judiciárias ao pouco caso que muitos pais fazem dos seus filhos, parece-me uma medida bem aplicada, mas não replicável muitas vezes.
A maioria destes pais não quer saber dos filhos, não reconhece importância à Escola e costuma desafiar a Justiça. Por norma, os seus rendimentos não vêm do trabalho, mas de ajudas de familiares, de amigos ou do Estado. Vivem em casas camarárias e aquilo que os filhos comem, calçam ou vestem provém da caridade pública ou do apoio social do Estado. Como esse apoio está cotado por parâmetros de sobrevivência, não é possível retirar-lhe qualquer fatia relevante para pagar uma multa deste calibre.

Apesar de não se conseguir cobrar a multa, a medida faz sentido e tem eficácia, pois funciona como efeito dissuasor para outros pais/encarregados de educação negligentes., já que estes pais têm receio que o subsidiozinho que recebem fique em perigo.
Saber que o Estado está atento e pode atuar sobre o seu pobre pecúlio talvez produza mais efeito do que dezenas de discursos do Diretor da Escola ou da Assistente Social.
 A educação dos filhos continuará a não lhes interessar nada, a não ser que o seu maço de cigarros fique em perigo ou não haja dinheiro para uns copos na taberna.
Gabriel Vilas Boas

domingo, 11 de setembro de 2016

SADNESS, OH THE SADNESS


Numa das suas músicas mais conseguidas, a sueca LYkke Lee proclama, com uma voz triste e doce, Sadness is a blessing. É muito difícil concordar com ela, ainda que a música seja realmente boa. No entanto, há algo de verdadeiro naquele verso triste da canção da sueca: a tristeza devolve-nos clareza de raciocínio perante a realidade.
Ficam mais percetíveis os erros assim como a força e a fraqueza de determinados sentimentos; a relevância de cada amigo torna-se mais precisa; a importância de pequenos objetos ou a dependência de um hábito ficam bem visíveis. O nosso mundo fica a preto e branco e com uma nitidez brutal.
De tão real e verdadeira, parece-nos que a fotografia obtida é definitiva. É a parte em que a tristeza se entrega facilmente nos braços da desistência e se consolam mutuamente.
Ainda que a foto obtida seja cruelmente verdadeira, ainda que não nos apeteça perseguir a mesma ou outra ilusão, a tristeza ainda não consegue fotografar o futuro.
Pode ter sido uma bênção ao colocar-nos os óculos corretamente, mostrando-nos que as cores do nosso quadro não tinham nem o brilho nem a intensidade que supúnhamos, mas a verdade é que a nossa vida não pode passar sem uma tela cheia de cor e de vida.
Talvez hoje ou amanhã ainda não seja possível pegar nos pincéis; provavelmente as cores disponíveis na paleta do momento ainda não terão a força suficiente para nos reerguer de imediato; no entanto, é imperativo voltarmos a acreditar no arco-íris que nos encantou e… desencantou.
Lykke Lee canta “Sadness is a pearl” – só na medida em que nos permite recomeçar, com mais lucidez, com mais verdade, com mais paixão pela Vida.
Gabriel Vilas Boas 

sábado, 10 de setembro de 2016

UM BAIRRO ALEGRE E MUITO CHIQUE


Perto de Aveiro, na margem do rio Boco, José Ferreira Pinto Basto instalou a mais famosa fábrica de porcelanas portuguesa: a Vista Alegre.
Em 1824, Pinto Basto mandou construir, em volta da fábrica de porcelanas, um conjunto de edifícios habitacionais e outros, com o intuito de instalar os operários fabris e respetivas famílias.
Visionário e profundamente humanista, Pinto Bastos mandou construir um bairro de raiz para os seus empregados, com todas as valências: uma escola primária, um posto de saúde, um campo de futebol, um corpo de bombeiros, uma capela, um teatro.

O fundador da Vista Alegre criava em Ílhavo um autêntico protótipo de cidade, onde os seus trabalhadores podiam viver alegremente. Além de ser um homem de visão e um empreendedor, Pinto Basto era muito bem visto pelos seus empregados o que fazia com que ninguém quisesse deixar de ser seu empregado e muito almejassem esse estatuto.
Durante décadas, a Vista Alegre consolidou-se como empresa e marca de excelência, representando o país na arte da faiança. Como qualquer outra empresa atravessou bons e maus ciclos económicos, mas dois séculos volvidos após a fundação o Bairro Vista Alegre continua de pé. Não já para albergar trabalhadores, mas como espaço de memória de um Portugal que existiu.

No começo deste século, o grupo hoteleiro Montebelo associou-se à Vista Alegre  para criar um hotel de cinco estrelas – o Montebelo Vista Alegre Ílhavo Hotel. Mais de oitenta quartos , espalhados por três pisos, cuja decoração tem a história da Vista Alegre incorporada na área moderna, já que a parte clássica do hotel (com dez quartos) ficou instalada no antigo palácio, que servia de residência à família Pinto Basto.
Todos os espaços sociais do Bairro Vista Alegre foram aproveitados pelo projeto hoteleiro, mas estão igualmente disponíveis para o grande público. Quem se instalar neste luxuoso hotel de Ílhavo pode fazer uma visita guiada pelo antigo bairro dos trabalhadores; visitar a fábrica, onde conhecerá todas as fases de produção das peças Vista Alegre, com destaque para a pintura manual; conhecer o centenário museu da Vista Alegre, com mais de trinta mil peças; fazer compras numa das três lojas do resort ou visitar a capela de Nossa Senhora da Penha de França, que acolhe milhares de pessoas no primeiro domingo de Julho, para celebrar a festa em honra da santa.
Falta falar do teatro. Criado em 1826 para entreter os familiares dos funcionários da fábrica e proporcionar-lhe momentos de lazer, descontração e cultura, o Teatro da Vista Alegre foi objeto de grandes obras de melhoramento e voltou a receber espectadores. Hoje está integrado na rede de centros culturais de Ílhavo e começa a ter uma programação regular de dança, música e teatro.
Hoje, quem vai visitar a Fábrica da Vista Alegre pode e deve demorar-se mais do que um par de horas. Há um bairro cheio de história e de arte, onde se pode ver teatro, fazer comprar, dormir e passear.

Gavb

sexta-feira, 9 de setembro de 2016

DE BUFO A HERÓI

Carlos Alexandre, o juiz justiceiro, que mandou prender Sócrates e Salgado, deu uma extensa entrevista à SIC e ao Expresso, onde, entre outras coisas interessantes, defende a instituição da figura da delação premiada, o que por outras palavras, quer dizer que defende a proteção e premiação de todos aqueles criminosos que colaborarem com a Justiça denunciando antigos camaradas de crime.
Apesar de perceber o desespero de Juízes e Procuradores, que sentem o cheiro do crime no arguido sentado diante de si, mas não têm uma prova material e concludente que o incrimina, não posso concordar com esta sugestão. Esta bufaria premiada pode resolver alguns problemas à Justiça e levará à justa condenação de alguns criminosos que de outro modo escapariam por entre os dedos ao sistema judicial, mas manchará para sempre a honra e a dignidade da Justiça.

Um Procurador a negociar com criminosos torna-o um parceiro do crime, e rapidamente se enredará numa teia perigosa e promiscua, que o inibirá em futuras atuações.
Percebo o desencanto, a mágoa, até a raiva do juiz alentejano, perante a convicção da culpa de Sócrates e a provável impossibilidade de o condenar, mas pedir que aceitemos a delação, como instrumento decisivo para desatar os intrincados nós dos casos de corrupção ou tráfico de droga, revela mais desespero do que coragem ou ousadia legislativa. 
Em pouco meses estaríamos de regresso aos tenebrosos tempos da Pide ou do KGB, onde toda a gente desconfiava de toda a gente e a sociedade vivia no medo e na ódio calado. Rapidamente assistiríamos à delação dos pecadilhos do vizinho à mistura com casos importantes e a Justiça ficaria ainda mais na mão de jornais e televisões sensacionalistas.

Recentemente, o Presidente da República desafiou os diversos agentes do poder judicial (juízes, procuradores, advogados) a fazerem propostas de alteração legislativa e funcional para tornar a Justiça mais célere e eficaz. 
A resposta do juiz mais famoso e admirado do país foi fraquinha a perigosa. Um bufo pode dar jeito hoje, mas nunca será de confiança. E nós precisamos de confiar na Justiça.
Gabriel Vilas Boas

quinta-feira, 8 de setembro de 2016

UM LUGAR ROMÂNTICO


A Quinta das Lágrimas é dos sítios mais bonitos de Coimbra e, provavelmente, o local mais romântico de Portugal.
Transformada há duas décadas em hotel de luxo e de charme, a Quinta das Lágrimas é um lugar de eleição para viver e reviver momentos de paixão e romantismo. Jardins, lagos, fontes, um palacete do século XVIII e um lugar onde D. Pedro e Dona Inês escreveram a mais bela e apaixonante história de amor da História de Portugal.


O conceituado e influente advogado José Miguel Júdice (proprietário) enquadrou neste lugar idílico um hotel belíssimo e encantador onde a modernidade se funde com o antigo, numa combinação muito feliz.
O Hotel da Quinta das Lágrimas é um lugar para desfrutar a dois. Apesar de situado no meio da cidade, a enorme quinta onde está implantado garante uma tranquilidade inusitada para um hotel citadino. Nos doze hectares da quinta destacam-se dois belíssimos jardins (o medieval e o romântico), uma mata onde saltam esquilos e voam vários tipos de aves, dezenas de árvores centenárias que dão gosto descobrir (sequoias, palmeiras, canforeiras, …), uma fonte mágica dos Amores, um espelho de água, um anfiteatro ao ar livre, onde no verão se podem ouvir concertos exclusivos.
Acoplado ao palácio do século XXVIII, o arquiteto Gonçalo Byrne desenhou um hotel moderno, onde pontificam uma piscina interior, uma sala para sauna e banho turco, uma sala de massagens e um espaço para treino. Curiosos são as salas onde se tomam as refeições. O jantar é servido no restaurante Arcadas, cuja cozinha é dirigida pelo chefe Vítor Dias enquanto o almoço é servido no Restaurante Pedro e Inês, com pratos muito sugestivos (Preliminares, Sopas para Encher o Coração, Peixes dos mares de Sereias, Amor Carnal, Sweets for My Sweet). Se estivermos no verão, a refeição pode ser servida no exterior do restaurante, onde a vegetação envolvente é música para os olhos; se estivermos no inverno, a lareira a crepitar na biblioteca promete um belo final de refeição.


Na Quinta das Lágrimas, Dom Pedro e Dona Inês de Castro encontravam-se, às escondidas, para viverem momentos únicos e maravilhosos de um amor maior e indestrutível. Passar uma noite na Quinta das Lágrimas é proporcionar àquele ou àquela que amamos um momento sublime e inesquecível.
Gabriel Vilas Boas

quarta-feira, 7 de setembro de 2016

DESAPEGAR-SE DO APEGO


Desapegar-se! De objetos, de coisas, de ideias, de pessoas, de sentimentos negativos ou mesquinhos – como é difícil! Normalmente, só aprendemos a desapegarmo-nos de algo ou de alguém quando o perdemos definitivamente.
Este sentimento de posse, que muitos confundem com amor, radica no medo. Medo de perder amigos, medo de perder segurança material, medo de perder importância social, medo de perder afetos, medo de… medo, medo e mais medo!



Há muitas pessoas que nunca se conseguiram separar dos brinquedos da infância, que podiam ter feito muitas outras crianças felizes, por medo de perder as memórias ternas desse tempo de luz, mas as bonecas na prateleira apenas lhes arrancam um sorriso baço e triste de todas as vezes que as miram.
Muitos escritórios estão cheios de livros velhos, carregados de pó que nunca foram abertos uma única vez, servindo apenas para pretextar um falso conhecimento ou decorar o espaço. Quem ama o conhecimento não o aprisiona e quer que ele chegue ao maior número de pessoas possível. Não tem medo que alguém faça melhor uso dele, não tem medo de ser ultrapassado.

Quantas pessoas não conhecemos que nunca saíram da sua cidade, do seu «ninho», tentando ser felizes noutro lugar, unicamente por medo? Conheço muita gente vive uma vida de dificuldades apenas porque nunca foi capaz de sair da sua zona de conforto ou que ela pensa ser a sua zona de conforto.

Falta ainda falar do pior dos apegos: o apego a sentimentos menores, sejam eles a posse, a vingança, o ódio, a descrença em si. O problema continua a ser o medo. O medo de falhar, o medo de ficar sozinho, o medo de dar uma imagem de fraqueza, o medo de perder.
O desapego melhora imenso a vida de cada um.
 O desapego não é desistir de algo ou de alguém, mas amá-lo tanto que lhe permitimos a liberdade de voar e nos permitimos a liberdade de arriscar Ser além de objetos, de sítios e de pessoas.
Desapegar-se é difícil e envolve riscos e coragem, mas costuma criar seres bem mais felizes.

Gabriel Vilas Boas 

terça-feira, 6 de setembro de 2016

O QUE É QUE O BAIANO TEM?


Caetano Veloso tem, sobretudo, uma voz lindíssima e sensual que me faz lembrar a serenidade do Oceano Pacífico. Muitas das suas músicas fazem parte da nossa memória pessoal e coletiva e possuem o condão de nos transportar ao mundo dos sonhos. Lá, onde tudo é pacífico e doce, a sua voz ganha o encanto das sereias.
Hoje e amanhã, Caetano dá dois concertos em Lisboa, para uma plateia selecionada, que rapidamente esgotou os caros bilhetes destes concertos. Apesar de ser possível ter a voz do baiano à distância de um click, é óbvio que o prazer de o ver e ouvir ao vivo é único.

O irmão mais velho de Maria Bethânia promete passar em revista os grandes êxitos de uma carreira extensa e muitas vezes polémica, porque Caetano não é politicamente correto. Como acontece com muitos artistas brasileiros, ele tem opinião cultural, social e política. Por exemplo, Caetano foi um dos grandes defensores de Dilma e é frontalmente contra o novo presidente Brasileiro, Temer, mas foi com Lula que a polémica estalou. O baiano chegou a chamar “cafona”, “analfabeto” e “grosseiro” ao antigo Presidente da República do Brasil.
Se na política Caetano está longe de ser consensual, na música todos se rendem ao seu violão e à sua voz. E não é para menos. A candura doce de “Leãozinho” comove qualquer um, do mesmo modo que “Menino do Rio” é o melhor bilhete-postal sonoro da cidade maravilhosa e “Sozinho” faz-nos lembrar quanto maravilhoso é amar alguém, apesar da ausência. No entanto, é em “Você é Linda” que Caetano melhor homenageia a beleza feminina. Com uma letra belíssima, onde o ritmo descontraído e a voz serena do cantor parecem pintar uma linda aguarela da Baía ao entardecer.
A imensa maioria de portugueses que não pode ver hoje nem amanhã este grande cantor brasileiro pode deixar que a música do baiano invada, por breves minutos, as suas quentes noites de fim de verão.
Gabriel Vilas Boas