O premiado cartoon de Vasco Gargalo é um murro certeiro na nossa noção de dignidade coletiva. Nele, o cartoonista português desenha uma mulher elegantemente vestido e ao seu lado uma pessoa de joelhos a costurar esse vestido extraordinariamente glamouroso, debaixo de uma máquina de costurar com o mapa do mundo.
Mais importante que o prémio da OIT e da ONG "Recursos Humanos Sem Fronteiras" é todos refletirmos no mensagem do desenho. O trabalho é fundamental, mas a escravatura é desprezível. E nenhuma circunstância justifica que nos aproveitemos das condições precárias de um povo, de um género ou de uma classe social para obtermos a um custo estupidamente baixo da mão de obra de um produto refinado e caro.
No negócio há espaço para o lucro e para a dignidade do trabalho. Essa dignidade repercute-se essencialmente no modo como é pago e nas condições de trabalho de quem o executa. Não há estilo nenhum numa joia ou num vestido ou nuns sapatos feitos por mãos escravas, ainda que essa escravatura não seja oficial.
O trabalho é feito por pessoas e para as pessoas. Se no processo, alguém vê a sua dignidade pessoal e profissional comprometidas, então o consumidor final não pode lavar daí as mãos como Pilatos. É ele que têm o poder de não pactuar com a degradação do ser humano. Não é uma questão de preço nem de "não tenho a nada a ver com isso". Temos todos a "ver com isso", porque a defesa da nossa dignidade começa na defesa e dignidade daqueles que são extramente pobres e muitas vezes precisam de trocar um pouco da sua dignidade por um prato de sopa.
Gabriel Vilas Boas
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