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terça-feira, 14 de março de 2017

UM FILHO POR ENCOMENDA


Notícias desta semana (não confirmadas, mas também não desmentidas) dão conta que Ronaldo contratou os serviços de uma barriga de aluguer americana para assumir a paternidade de dois gémeos. Talvez por ser o Ronaldo, poucos comentários negativos houve, mas a mim a ideia está para lá do bizarro. Até porque Ronaldo não é apenas mais um bom jugador de futebol, como ele bem sabe e todos os dias lhe lembra o homem do marketing e da imagem.

Se bem me lembro, em 2010, quando nasceu o seu primeiro filho, Ronaldo namorava com Irina, mas a criança proveio de uma relação ocasional com uma americana. Ronaldo pagou o silêncio da mãe e ficou com a criança, numa espécie de acordo económico muito censurável do ponto de vista ético e moral. Pareceu não ter sido um caso pensado, mas uma reação a algo que o futebolista não estava a contar.

Seis anos volvidos, a imprensa anuncia que Cristiano Ronaldo será pai novamente. Novamente Ronaldo tem namorada e novamente não parece ser ela a mãe. O que há de novo? Agora parece que não foi um acidente, mas um caso planeado.

Um filho não é um fato, a playstation ou um carro desportivo – agora apetece-me um, posso pagar, vou ali e já está. Um filho tem direito a ter pai e mãe, acima de todo o luxo e bem-estar. Se ninguém ainda disse isto a Ronaldo, já o devia ter feito.
Ronaldo acha que o seu filho precisa de irmãos? Então, faça as coisas com a dignidade que um filho merece: encontre alguém que ame o suficiente para a fazer mãe dos seus filhos.


É verdade que isto é um assunto privado e a vida pessoal do Ronaldo ao Ronaldo diz respeito, mas Cristiano Ronaldo escolheu ser uma figura pública e uma figura pública não pode apenas colher os benefícios da sua popularidade, mas também tem de ser confrontado com a irreflexão de alguns atos. E este, a confirmar-se, não fica nada bem no seu currículo.
P.S. Obviamente a notícia ainda não está confirmada, mas já passou demasiado tempo para Ronaldo a desmentir e ele não o fez. E este é um assunto sobre o qual ele devia tomar uma posição firme desde o início, sob pena de pensarmos que apesar de não o ter feito ou não o ir fazer, não se importava nada de o concretizar.
GAVB

segunda-feira, 13 de março de 2017

A TUA DIVERSÃO INCOMODA O MEU SONO


«Gostava muito de morar aqui, mas eu tenho o sono leve e aqui nem sequer adormecia» - morador do Bairro Alto.


Hoje entra em vigor a nova lei do ruído que impede música na rua depois das 23 horas, mas em Portugal a lei quase nunca resolve os problemas. Quanto muito serve para amedrontar, para cobrar umas coimas ou para ser descaradamente desrespeitada.
O equilíbrio entre o justo direito ao sossego e ao sono dos moradores dos bairros mais típicos e turísticos de Lisboa e o direito à diversão noturna dos noctívagos está cada vez mais difícil de alcançar, especialmente em Lisboa, onde o turismo impõe a sua ditadura.

Alfama e o Bairro Alto são bairros típicos de Lisboa, que os turistas adoram visitar. Muito do seu charme também reside no tipo de pessoas que lá vivem, mas estes estão cada vez mais encurralados pelo turismo que impõe as suas festas, a sua música, as suas sonoras gargalhadas pela noite dentro e porta fora.
O Bairro Alto e Alfama já não são apenas as casas de fado, já não se exprime só dentro de quatro paredes. Por muito que a lei impeça o barulho ele vai continuar a existir, porque o negócio é um vendaval que leva tudo à frente. Para já, começou por obrigar os donos dos bares a insonorizar espaços, a investir em portas de acrílico, a criar antecâmaras nos seus estabelecimentos comerciais, a comprar reguladores de som. É outro mercado a crescer à custa da lei do silêncio.

O barulho dentro dos estabelecimentos noturnos pode ser regulado, medido, multado, mas as conversas, os risos, as sonoras bebedeiras no exterior nunca o serão. Por muito que os moradores adorem os turistas que lhes alimentam o estilo de vida, por muito que os turistas achem piada à companhia daquela gente genuína e típica de uma Lisboa a desaparecer, alguém vai ter que sair… a perder. Acho que serão os moradores.
No Porto, felizmente, este problema não se põe de uma maneira tão intensa. A anterior vereação permitiu que a maioria dos bares abrisse numa zona de escritórios e lojas. Foi uma medida acertada que acordou a vida noturna do Porto e deu outro glamour à cidade. Mesmo a Ribeira conseguiu uma boa relação entre o interesse dos moradores e o interesse dos noctívagos.
Infelizmente para os lisboetas, no Bairro Alto e em Alfama já não se canta apenas o fado e por isso “silêncio, que eu quero dormir” ... nem à força de lei.
GAVB 

domingo, 12 de março de 2017

A DÉSPOTA MANIA DE IMPORMOS AS NOSSAS SEPARAÇÕES


«O meu pai não me deixou ir a casa da minha avó, quando eu estava com saudades dela. Até parece que nunca teve saudades!»

A vida também feita de muitos desencontros, dolorosas separações que não sabemos como enfrentar. Entre casais, com os filhos, com os pais, com os amigos, às vezes, até com um sítio.

Um erro que cometemos com frequência é querer obrigar aqueles que estão connosco a separarem-se também. É um erro terrível, insensato e egoísta! Uma espécie de retaliação, com danos colaterais, que atinge os inocentes que estão no meio.
É a mãe que proíbe os filhos de ficarem em casa do ex-marido logo que sabe que este já tem uma nova namorada; é o pai que impede as filhas de ver a avó, quando foi apenas ele que se zangou com a mãe; é a pressão que fazemos com alguns amigos ou amigas para que deixem de falar ao outrora nosso(a) melhor amigo(a), quando com ele(a) cortamos relações.

Estes desejos revelam apenas uma grande frustração e imaturidade, até porque familiares e amigos não são marionetas ao serviço dos nossos caprichos e vingançazinhas sem sentido.
A vida está cheia de relações que terminam de um modo insatisfatório, por vezes injusto, mas essas são histórias que apenas a nós dizem respeito. Por muito que ainda haja feridas por cicatrizar e as relações daqueles que amamos desajudem, não temos o direito a constrangê-los, especialmente se estivermos a falar de crianças, pois estas não têm poder para impor a sua vontade.
Além de corrermos o risco de sermos solenemente enganados, deixamo-nos consumir por atitudes mesquinhas, o que só atrasa a nossa recuperação afetiva.
Crescemos muito mais na adversidade e na luta contra as nossas imperfeições do que em atitudes egocêntricas.

GAVB

sábado, 11 de março de 2017

OS PAIS TAMBÉM PRECISAM DO COLO DOS FILHOS



Rita, Ricardo e Ana nunca tinham visto os pais chorar como nunca os tinham visto discutir; por isso, aquelas lágrimas do pai eram incompreensíveis para os três.
Durante anos, habituaram-se a contar com os pais para quase tudo: iam buscá-los ao colégio, às aulas de dança, ao futebol e às festas dos amigos; estudavam com eles; amansavam as suas fúrias com os(a) namorados(a);compreendiam os seus medos e inseguranças; satisfaziam, na medida do possível, os seus desejos consumistas e até tinham abdicado dos seus programas favoritos de televisão.

Toda aquela preocupação centrada neles parecia-lhes natural, óbvia, justificada. Sempre acharam que “tudo” estava bem com eles, mas a verdade é que nem costumavam perguntar ou perguntavam daquele modo automático e desinteressado como se não esperassem outra coisa que não aquela resposta de gravador: “Sim, claro!”, acompanhada daquele sorriso de plástico que nunca tinham reparado que era de plástico.

As inesperadas lágrimas do pai abriram os olhos dos irmãos para uma realidade familiar que nunca tinham imaginado – os pais também tinham problemas e também não sabiam como resolvê-los. A diferença é que não havia quem os ajudasse, quem os mimasse ou simplesmente os olhasse com ternura e amor e reduzisse o problema a uma circunstância.

Rita descobria que os pais, na sua ânsia protetora, só a tinham ensinado a receber. Ricardo e as irmãs experimentavam, pela primeira vez, um obstáculo que não sabiam como ultrapassar.
Sabiam muito pouco do quotidiano do pai e da mãe: os seus gostos, os seus problemas, as suas canseiras.
Naquela noite, Rita deixou o telemóvel no quarto; Ricardo ligou a televisão da sala na telenovela que a mãe espreitava enquanto arrumava a loiça do jantar enquanto Ana, sentada no sofá entre o pai e a mãe, pediu ao pai que lhe contasse, com pormenor, como tinha sido o seu dia.

GAVB

sexta-feira, 10 de março de 2017

SERÃO OS DIRETORES A MUDAR OS CURRÍCULOS E NÃO O MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO


“Não está, nem esteve, a ser equacionada qualquer redução da carga horária das disciplinas de Português e Matemática, nem tal alguma vez foi afirmado pelo ME” fonte oficial do Ministério da Educação, citada pelo jornal Público.

Provavelmente os lobbies do Português e da Matemática mexeram-se e o ME fez marcha atrás na ideia de retirar aulas a Português e Matemática, para as dar às Expressões, História e Área Projeto, como anunciava o Expresso há semanas.

A única coisa que o ME parece manter é a autonomia da Escola para decidir 25% do currículo, o que reforçará o poder dos Diretores, tal como afirmei no passado (Mais uma vez, a nova frente de luta da Fenprof será votada ao fracasso). A coberto da autonomia das Escolas, os Diretores de Escola (especialmente nas E.B. 2/3) poderão decidir reduzir o Francês a metade do horário do Inglês; aumentar ou diminuir o horário de História/Geografia, reforçar ou não Educação Visual. Os critérios e as justificações ficarão a seu cargo. Haverá grupos disciplinares beneficiados e outros prejudicados.

Certamente muito farão uma gestão correta, procurando que certas turmas, com mais dificuldades de aprendizagem, tenham um horário mais preenchido com disciplinas práticas e menos tempos de Português, Inglês, Matemática e História, por exemplo. Proliferarão currículos alternativos um pouco por todas as escolas, desde que o sucesso escolar seja garantido, os professores andem mais ou menos satisfeitos e aqueles que costumam “dar mais negativas” tenham um papel simbólico na passagem dos alunos.

Como a carga das disciplinas ditas teóricas vai diminuir, em algumas turmas, cumprir o programa será opcional, mas também não haverá grandes cobranças, até porque os exames nacionais foram substituídos por provas de aferição até ao 9.º ano de escolaridade.
O ME procurará contentar todos, sem se comprometer com ninguém. No fundo, aquilo que o ME pretende é uma espécie de Escola a duas velocidades, sem que o tenha de assumir.
Será uma revolução tranquila e disfarçada. Com o Diretor ao leme e a municipalização como pano de fundo.
GAVB


quinta-feira, 9 de março de 2017

A VIDA ESTÁ DIFÍCIL POR TODO O LADO, NÃO SÓ NO SUPERMERCADO


Hoje a Visão publica uma interessante reportagem sobre as difíceis condições de trabalho dos trabalhadores dos supermercados portugueses, destacando, sobretudo, a roleta russa dos horários, o magro salário, a alteração constante de funções, a coação psicológica, o assédio moral, os objetivos de produtividade irrealistas e desumanos.

Infelizmente, o microcosmos dos empregados de supermercado é só mais um exemplo da degradação das condições de trabalho, a que muitos trabalhadores chegaram. Outras profissões experimentam horrores semelhantes: os bancários, os enfermeiros, os empregados das lojas dos centros comerciais.

O que mais me choca nem é o baixo salário pago para aquilo que é exigido ao trabalhador, mas as condições desumanas em que muitos trabalham, a pressão psicológica a que são submetidos, os objetivos quase irrealizáveis que os coagem a aceitar.




O trabalho não perdeu somente valor, perdeu sobretudo dignidade. 
E não há sucesso empresarial que possa frutificar sem haver respeito pelo trabalhador, na sua dimensão pessoal, social, afetiva.

É falso pensarmos que a lógica económica impõe a degradação das condições de trabalho. É falso pensarmos que a culpa é do liberalismo, do capitalismo, da competitividade. 

É possível encontrarmos várias empresas, espalhadas pelo mundo, que desmentem essa teoria. Há sociedades que sempre foram ricas, respeitando os direitos dos seus trabalhadores como há sociedades que sempre foram pobres, pensando que chegariam a ricas se baixassem o nível de dignidade do trabalho.
É muito importante colocar mais uns euros no bolso dos trabalhadores portugueses todos os meses, nalguns casos, urgente, mas acho prioritário assegurar a dignidade das condições de trabalho.
Talvez não fosse má ideia que parte das coimas aplicadas às empresas, por desrespeito ao código do trabalho, revertessem a favor dos trabalhadores. Se foram eles os lesados, por que é que é o Estado a arrecadar?

GAVB 

quarta-feira, 8 de março de 2017

A MULHER MAIS BONITA DO MUNDO


Estás tão bonita hoje. 

Quando digo que nasceram 

flores novas na terra do jardim, quero dizer 

que estás bonita.

Entro na casa, entro no quarto, abro o armário,

abro uma gaveta, abro uma caixa onde está 

o teu fio de ouro.



Entre os dedos, seguro o teu fino fio de ouro, como 
se tocasse a pele do teu pescoço. 


Há o céu, a casa, o quarto, e tu estás dentro  de mim. 



Estás tão bonita hoje. 
Os teus cabelos, a testa, os olhos, o nariz, os lábios. 

Estás dentro de algo 
que está dentro 
de todas as  coisas,
 a minha voz nomeia-te 
para descrever a beleza. 


Os teus cabelos, a testa, os olhos, o nariz, os lábios. 

De encontro ao silêncio, dentro do mundo, 
estás tão bonita é aquilo que quero dizer. 

José Luís Peixoto, in "A Casa, a Escuridão"