A pergunta pode parecer tonta para alguns, mas não para todos, tendo em conta as regras (alteradas) que vigoram para este concurso de vinculação.
Quem quiser vincular terá de concorrer a todo o país, o que não será nada oportuno nem vantajoso para a maioria dos candidatos. Em primeiro lugar, porque isso implicará, para a grande maioria, uma mudança radical de vida, com a separação da família, maiores custos e, nalguns casos, diminuição de rendimentos.
Qualquer professor que vincule a mais de cem quilómetros da sua residência terá um abatimento no seu salário na ordem dos 50%, ora isso reduz o rendimento final a um valor inferior ao salário mínimo nacional. A boa notícia é que vincula a um "emprego para a vida", mas talvez isso não seja suficiente em tempos em que o rendimento das famílias desceu acentuadamente com a pandemia.
Há também a ponderar que vincular longe de casa não será uma situação revertível em um ou dois anos. Se há mais de cinco mil professores com mais de 15 anos de ensino que ainda não efetivaram, isto quer dizer que estarão na casa dos quarenta anos de idade, com família constituída, muitos deles, e uma vida familiar organizada.
Por outro lado, a maneira como a sociedade e o poder político trataram os professores, nos últimos vinte anos, não permite, a ninguém, encarar os próximos vinte com otimismo.
As perspetivas do ensino público em Portugal são sombrias, porque os mais competentes se retiram e os mais promissores não se aproximam. Teremos uma classe docente menos competente, dedicada e claramente sem espírito de missão.
Quem sofrerá mais? Aqueles que não podem pagar duplamente para educar os filhos, ou seja, aqueles que dependem da escola pública para furar a barreira social com que a demagogia os cercou. Mas os outros também não se ficarão a rir, pois pagarão por aquilo que tinham de graça. E dirão a tudo que sim: métodos, horários, notas, exigência, visto que não terão uma verdadeira alternativa.
O destino para onde caminhamos lentamente, com as desvalorização dos professores e da escola pública, levará a uma sociedade mais desigual e a desigualdade impede o progresso de um povo. Investir na educação é investir no bem estar dos professores e outros profissionais que com eles trabalham. E investir não é necessariamente aumentar os ordenados aos professores. Há muito por fazer noutras áreas e este concurso põe isso a nu. É preciso assegurar gratuitamente casa para os professores deslocados das suas residências; seria desejável que as famílias se pudessem reagrupar facilmente noutra cidade do país, facilitando-se a mobilidade profissional do outro membro do casal, sobretudo quando ele também trabalhasse para o Estado.
A carreira de professor não é atrativa por várias razões. Da desconsideração ao salário, do preço da gasolina e das portagens ao custo com as ferramentas de trabalho (computador e internet) - tudo é pago pelo docente.
Hoje, um jovem inteligente e ambicioso não quer ser professor. Poucos pais professores querem o seu presente para o futuro dos seu filhos. E isso é dramático e triste, sobretudo porque a educação dos netos pode ter uma leveza insustentável.
P.S. É simultaneamente reconfortante e triste ver que uma federação desportiva faz um vídeo de agradecimento aos professores, usando a imagem de um dos jogadores de futebol mais marcantes dos últimos vinte anos, ao mesmo tempo que na última década nenhum ministro da Educação o fez semelhante, com tanta simplicidade e sinceridade.
Gabriel Vilas Boas