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domingo, 12 de janeiro de 2020

O DIA EM QUE O DAKAR PERDEU O ENCANTO

«O que fazemos aqui? Para quê?», pergunta o múltiplo vencedor do Dakar Stephane Peterhansel, também ele consternado pela trágica morte do motociclista português Paulo Gonçalves.

Todavia ele sabe perfeitamente a resposta. Ele, Paulo Gonçalves e todos aqueles que participam no Dakar, em todos os Dakares, estão ali porque «só» conseguem viver, exercitando a arriscada arte de desafiar a morte. E isto acontece não porque eles são uns maluquinhos inconscientes, mas porque há paixões humanas que têm o risco permanente por parceiro.
E como muito bem alguns sabem, mais difícil do que fugir  ao destino é fintar uma paixão, sobretudo quando ela atrai mais do que desilude. 

Ser corredor de automóveis ou de motas é viver em união de facto com o risco absoluto e o Dakar é uma espécie de Himalaias desse absoluto, onde a vida é apenas um acessório de luxo.
Chegar ao fim do Dakar sempre foi uma espécie de primeira grande vitória, perante as múltiplas ratoeiras do percurso duro e imprevisível, que os pilotos tentavam ludibriar, quer a prova se disputasse em África, na América do Sul ou nas areias da Arábia. 
Hoje,o Dakar sugou mais uma vida, a do português Paulo Gonçalves. Uma pedra de gelo no ânimo lusitano, servida ao pequeno-almoço e que tornou ainda mais frio este domingo de janeiro. 

Uma tristeza profunda! Talvez Paulo Gonçalves não tivesse a noção de quanto era querido e amado pelos seus compatriotas, mas esta profunda tristeza que nos invade demonstra bem quanto o considerávamos. 
Tal como aconteceu com a Fórmula I, quando Ayrton Senna perdeu a vida em pista, hoje morreu, em mim, a paixão pura pelo Dakar. Qualquer vitória ou glória futura trarão sempre a dor e as lágrimas da morte de Paulo Gonçalves. As cicatrizes nunca se esquecem, apenas deixamos de falar delas.

Caro Peterhansel, ainda que ele fosse alguém que conhecesse os riscos, que o motociclismo e o Dakar fossem a sua paixão, e tenha partido a fazer aquilo que o apaixonava, tu sabes bem que é sempre difícil de engolir cada vez que acontece. Talvez porque viver é a suprema das paixões. 

Gabriel Vilas Boas

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