Pode a
escolha de uma morte digna sobrepor-se ao direito à vida? Deverá esta ser
prolongada mesmo que isso implique mais sofrimento? A Assembleia da República
volta a debater a eutanásia com os projetos de lei do PS, BE, PAN, PEV e
Iniciativa Liberal (IL), apesar das críticas da Igreja Católica e da Ordem dos
Médicos.
Há
dois anos faltaram cinco votos para que a lei sobre a eutanásia fosse aprovada,
agora existe uma maioria que quer despenalizar a morte medicamente assistida,
contra a qual o PCP e o CDS-PP e Chega se manifestam.
Apesar
da opinião dos partidos me interessar pouco, a verdade é que são eles que vão
decidir alterar a lei, mesmo sem querer saber a opinião dos portugueses. Dizem
que os “direitos fundamentais não se referendam” para se justificarem, mas não
há justificação para que dezenas de deputados se arrogarem no direito de decidir
sobre algo tão fundamental sem nos ouvir. Como sabem se é isto que queremos,
logo eles que foram eleitos por pouco mais de metade dos eleitores? Sabem-no
por intuição? Porque estava os seus programas eleitorais? Nos programas
eleitorais dos partidos está o combate à corrupção há dezenas de anos e no
entanto ela têm aumentado, sendo muitos deputados e ex-deputados infelizes
protagonistas.
Viver é
um direito e não uma obrigação. Nunca foi uma obrigação! O que não havia nem
há, por enquanto, é a morte medicamente assistida, a que pomposamente querem
chamar “morrer com dignidade”.
Talvez
seja fácil alocar recursos a quem quer “morrer com dignidade”, quando não se
permitiu a essas mesmas pessoas viver com dignidade.
É
sempre mais fácil deitar ao lixo do que consertar, que é como quem diz “cuidados
continuados”. É consensual que vivemos num triste tempo em que as pessoas vivem
relações frágeis e muito relativas, em que se sentem tão descartáveis quanto um
saco de plástico. E é precisamente nesta altura que se discute a eutanásia. Que
péssimo sinal damos! No entanto, ele não é surpreendente, mas tão somente
coerente.
Queremos
dar poesia à morte, quando a vida tem sido um horrível conto de segunda
categoria.
Entendo
e respeito o ponto de vista daqueles que defendem a eutanásia como uma solução
para terminar com os sofrimentos horríveis e sem reversão, mas a realidade será
muito menos poética. A realidade é aquela que já se discute no país das
liberalizações – A Holanda – onde o debate já está no “comprimido gratuito para
maiores de 70 anos cansados de viver”.
E porque
não um brinde? Daqui a uma década estaremos a discutir um incentivo às famílias
para os encorajar a aliviar os encargos da Segurança Social ou dos Hospitais,
permitindo que os doutores da morte aliviem as dores daqueles que se recusam a
morrer naturalmente e em tempo útil.
E é
tão fácil fazermos um velhinho desejar morrer! Basta enchermos-lhes o coração
de mágoa e tristeza, deixá-lo abandonado a um canto do lar de terceira
categoria para que sejam eles a pedir o comprimido gratuito que lhes permita
morrer com dignidade, porque nós lhes damos uma vida indigna.
Talvez
daqui a uma década aquela anedota* sobre a morte de um velhinho deixa de nos
fazer sorrir, porque optamos agora por priorizar a morte em vez da vida.
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