«Embora o meu país tenha tomado a decisão louca, infantil e provavelmente suicida de abandonar a Europa, eu continuo a sentir orgulho de ser europeu e da grande experiência social que a União Europeia representa. Na minha cabeça, ainda estou na Europa e é lá que vou ficar. Para a Inglaterra está tudo acabado e as gerações vindouras avaliarão os resultados.
Mas estou a escrever-vos porque quero dizer-vos o que aconteceu a Inglaterra.
Todos os ingredientes sistémicos de que provavelmente têm conhecimento: uma imprensa corrupta e enganadora, pertença de umas poucas pessoas muito ricas; uma ilusão absurda e bem alimentada sobre o passado imperial de Inglaterra; uma imprensa que vive de atenção e de cliques e por isso amplia as hipóteses políticas de entertainers como Trump e Johnson; um ecossistema de redes sociais que conduz à polarização, em vez de [promover o] compromisso, e uma série de líderes indistintos que aparentemente nada sabiam sobre estes problemas sistémicos.
Mas houve outra coisa e o objetivo desta carta [é apontá-lo]: aqueles dentre nós que se consideram liberais ou socialistas ou democratas não estiveram atentos. A maioria não reparou que, para a classe trabalhadora, as condições se agravavam de ano para ano. E não nos apercebemos que a imprensa do esgoto atribuía a culpa dessas condições às vítimas - os imigrantes, os pobres, os assistentes sociais, os professores, os estrangeiros... e, acima de tudo, a União Europeia.
Não reparámos porque a nossa vida não era assim tão má - todos tínhamos os nossos iPhones e as nossas aplicações e as nossas contas na Amazon e os nossos voos baratos para zonas costeiras e outras formas de gastar o tempo. Entretanto, uma revolução estava a acontecer. Não a reconhecemos porque sempre pensámos que os revolucionários devíamos ser nós. A revolução aconteceu e nós estávamos alapados a ver Netflix.
Estou certo que os vossos países também enfrentarão, em breve, campanhas para sair da União Europeia, se é que já não enfrentam. A União Europeia é um alvo fácil para qualquer político ambicioso.
Querem tornar-se um grande nome na política?
Identifiquem um problema, digam que a culpa é da União Europeia e depois cavalguem a onda nacionalista com a ajuda que os media inevitavelmente vos darão.
Por favor, amigos na Europa - não façam os mesmos erros estúpidos que nós. Não se limitem a rir de pessoas como Trump e Johnson e todos os outros, porque em breve eles irão devorar-vos.
Se queremos uma Europa unificada, precisamos de defendê-la agora. Falar sobre ela. Pensar sobre ela. Melhorar e resolver as coisas.
Brian Eno, músico e produtor inglês.
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