Já estamos mais do que habituados ao uso do desporto para fins de propaganda política e até os privilégios pelas quais certas modalidades vendem o jeitinho que fazem ao populismo.
Nos EUA, a liga de futebol americano - supremo jogo dos brancos - só condenou o racismo quando não podia fazer mais nada e inclusive já tinha anatemizado um jogador negro que reclamou igualdade.
E do Brasil acaba de nos chegar a notícia da utilização de vários momentos da transmissão do Peru-Brasil, na estação estatal TV Brasil, para atingir a TV Globo, a cadeia de televisão que mais tem criticado o presidente Bolsonaro.
Nada disso me assusta tanto como a suspensão do multimedalhado nadador nipónico Daiya Seto, pelo Comité Olímpico do Japão, para os Jogos de Tóquio 2020, que, como se sabe, estão marcados para 2021.
Casado, foi apanhado num vídeo a entrar num hotel com a amante. O Comité Olímpico suspendeu-o de imediato porque - parafraseio - os atletas devem comportar-se de modo socialmente exemplar. Sem alternativa, Seto pediu desculpa "pelo comportamento irresponsável", aceitando passar o resto do ano a treinar sozinho.
No Brasil e face à rábula da TV Brasil, alguém perguntou:
« Mas estamos na Coreia do Norte?!»
E eu não sei se alguém, no Japão, alguém perguntou:
« Mas estamos no EUA?!»
É que nos EUA, ao menos, o adultério, continua delito criminal em 19 estados. No Japão deixou de sê-lo há 70 anos. E agora voltamos para trás. Voltamos para trás porque, em geral, o mundo voltou para trás.
Estamos mais conservadores, mais moralistas, mais incivilizados. E o desporto continua a deixar-se utilizar como instrumento desse retrocesso. As gerações futuras não se esquecerão.
Joel Neto