Quarenta
e oito horas após os atentados de Paris, a Europa vai ganhando consciência do
pesado simbolismo destes tristes acontecimentos. As mortes dos jornalistas do
“Charlie Hebdo” trazem novamente à ribalta um problema por resolver e de que
França será sempre o palco: a intolerância civilizacional. Há uns anos Sarkozy
lançou o debate com a polémica proibição do véu islâmico, mas a sociedade
francesa não apoiou cabalmente o seu presidente e o debate essencial ficou, no
essencial, por fazer.
O
aparecimento do Estado islâmico, durante 2014, aprofundou a deriva terrorista
dos radicais islâmicos, perante o lamentável silêncio dos principais líderes
mundiais do Islão, que preferiram (preferem?) esperar para ver. Os americanos
reagiram tarde por causa dos seus homens, a Europa lamentou e foi só. Agora a
França sangra onde mais lhe dói: a liberdade de imprensa e de expressão.
Se há
coisa onde os franceses não transigem é no valor da liberdade. Não há interesse
económico que os faça engolir sapos vivos e ainda bem que assim é. A liberdade
de imprensa é um pilar fundamental dessa liberdade, não havendo cláusulas de
exceção. O “Charlie Hebdo” era a expressão radical dum jornalismo ousado,
polémico, provocador e… livre, por isso os franceses nunca hesitaram em
defendê-lo. Firmes na sua convicção, os franceses arrastaram o resto da Europa
onde a palavra tolerância não é apenas uma ideia bonita.
Fiéis
aos seus valores fundamentais, os franceses não reclamam vingança e continuam a
acolher aqueles que não aceitam a diferença. No entanto, essa generosidade não
foi suficiente. Evocando a defesa da honra de Alá, um bando de radicais
islâmicos assassinou o coração da liberdade, mostrando o lado negro duma fação
do Islamismo. Podemos afirmar convictamente que o Islão “não é aquilo”, mas a
verdade é que também é aquilo.
Aqueles
homens mostraram que há uma fação do mundo islâmico que revela um profundo
desrespeito pela vida humana. Lamento muito que os mais importantes líderes
islâmicos não tenham percebido que nada faz pior à religião do profeta Maomé do
que atos como os ocorridos em Paris. Como muito bem notou José Saramago, “Matar
em nome de Deus é converter Deus num assassino.”
Os
atentados de 7 de janeiro, em Paris são um desafio civilizacional enorme quer
ao mundo islâmico quer à cultura europeia de tolerância e liberdade de
expressão.
A
tarefa dos Xeiques não é nada fácil: ensinar a tolerância num meio duma cultura
intolerante, sob pena de tornar o islamismo uma religião odiada por milhares de
pessoas, tal a sua permanente ligação a casos como o de Paris. Os chefes
religiosos islâmicos precisam de fazer algo objetivo e claro, porque não fazer
nada, não dizer nada é uma resposta errada, perante a urgência do momento.
A
França tem de vencer o medo, despir a raiva da alma e afastar os ímpetos de
vingança indiscriminada sobre tudo o que usa véu. E tem ainda um trabalho de
Hércules para fazer: fazer-se respeitar, fazendo respeitar a sua cultura.
Mais
importante do que converter um radical é não deixar que um extremista nos
radicalize!
Gabriel Vilas Boas